Jailson Bittencourt, Luiz Drude de Lacerda, Ednildo Torres,
Angelo da Cunha Pinto, Dora Leal, Núbia Ribeiro e Marcos Buckeridge
Angelo da Cunha Pinto, Dora Leal, Núbia Ribeiro e Marcos Buckeridge
Mais de 12 mil quilômetros e oito dias de viagem passando por temperaturas entre 30ºC e -8ºC. Esta foi a experiência narrada nesta quinta-feira, 06/11, pelo professor Ednildo Torres, do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia (INCT)- Energia e Ambiente, no 4º Encontro Preparatório para o Fórum Mundial de Ciências. A experiência faz parte dos estudos sobre a utilização de biocombustíveis, um dos assuntos que compuseram a segunda etapa de debates, cujo tema central foi “Os Desafios da Bioenergia”. A mesa foi coordenada pela Reitora da Universidade Federal da Bahia (UFBA), Dora Leal.
Biodiesel sem fronteiras
Segundo Torres, 45% da matriz energética brasileira é composta por fontes renováveis, como biomassa de cana de açúcar, energia hidráulica, lenha e carvão vegetal. Os 55% não renováveis englobam petróleo e derivados, gás natural, carvão mineral e urânio. Os transportes são responsáveis por grande parte do consumo de energia no país, liberando enorme quantidade de CO² na atmosfera. A nível mundial, petróleo, gás natural e carvão correspondem a quase 80% da matriz energética. Diante destes dados, Torres sugeriu algumas soluções para a emissão de poluentes, dentre elas a utilização do álcool e do biodiesel como combustíveis: “Antes tínhamos um problema com a substituição de gasolina, mas hoje temos o etanol. Antigamente, não tínhamos um substituto para o diesel e hoje temos a possibilidade de usar biodiesel”.
Para comprovar a eficácia do biodiesel, Torres e uma equipe composta por mais quatro pesquisadores percorreram um trajeto de 12.350 Km de Salvador ao Peru em duas pick-ups, utilizando o biodiesel B100, e diesel comercial B5. “Os veículos se comportaram bem e os combustíveis melhor ainda. Tivemos a repetição dos experimentos bem sucedidos realizados em laboratório”, afirmou Torres. “Cerca de 60% do uso de combustíveis utilizados em veículos no Brasil é à base de diesel. Com esse trabalho, apresentamos a possibilidade de substituição de 100% do diesel convencional por um combustível que seja renovável, o que significa menor impacto ao meio ambiente, mais produção de óleos vegetais, mais renda e mais emprego para o brasileiro”. No momento, o professor está realizando testes com a mistura de biodiesel e álcool em diesel.
Desafios na produção de bioetanol
Em seguida, o professor Marcos Buckeridge, coordenador do INCT de Bioetanol, apresentou os desafios científicos na produção de bioetanol no Brasil. Segundo ele, o Brasil é o país que mais usa biomassa no mundo, o que não está relacionado apenas à queima de biomassa, mas também ao uso da cana de açúcar para produzir etanol. Historicamente, com a descoberta do petróleo e o seu uso para combustíveis, o uso de etanol sofreu uma queda, sendo usado apenas em momentos de crise. “Na era do Proálcool, tínhamos um problema técnico que era a corrosão. Hoje, se conseguirmos fazer com que o diesel seja usado com o álcool será muito interessante”, disse Buckeridge.
O palestrante explicou sobre a primeira geração do bioetanol em que um terço da energia da cana de açúcar vem da sacarose obtida quando se espreme o caule. A segunda geração seria a utilização de 100% da cana, obtendo mais um terço da energia da palha e outro terço do bagaço: “Se eu usasse toda a energia que existe no corpo da cana, poderia triplicar o que eu tenho de produção hoje, mas não posso fazer isso porque uma boa parte da energia do bagaço está sendo usado pra fazer bioeletricidade”, disse. Caso pudesse usar tudo, a produção de etanol aumentaria em 40%.
Atento às pesquisas em etanol realizadas pelo INCT de Bioetanol em parceria com outros órgãos, o Banco Nacional do Desenvolvimento (BNDES) lançou um edital de 1,5 bilhões de dólares voltado para esta área. “Não sei de outra área no Brasil que tenha um investimento tão grande. É um bom investimento em ciência básica e, se tudo der certo, o Brasil vai ganhar mercado”, afirmou Buckeridge.
Impactos da produção de energia nos oceanos
A terceira apresentação do dia foi do Acadêmico Luiz Drude de Lacerda, do INCT de Transferência de Materiais Continente-Oceano (TMCOcean). Lacerda falou sobre a densidade crescente de áreas exploratórias e equipamentos de produção no mar e a consequente contaminação das águas por metais como cobre, ferro, zinco e manganês. Devido à atividade de produção na plataforma continental, é difícil diferenciar alterações nas concentrações de metais. “Quando você analisa uma grande amostra de águas, não consegue diferenciar estatisticamente uma área de controle de uma que receba a emissão de água”, explicou. Por isso, segundo ele, é necessário que se pense em outro modelo de monitoramento ambiental.
Educação no Brasil: do ensino básico ao setor industrial
Por fim, o professor Angelo da Cunha Pinto do Instituto de Química da Universidade Federal do Rio de Janeiro (IQ-UFRJ) falou sobre educação no país. O professor Cunha apresentou um panorama da educação no Brasil sob seu ponto de vista, desde os marcos históricos como a criação do Ministério dos Negócios da Educação e Saúde Pública em 1930, até os problemas atuais e os desafios que deverão ser enfrentados pelas Universidades. Dentre eles, Cunha citou a profissionalização da administração universitária, a forma de escolha e ocupação dos órgãos de Direção e a construção da autonomia universitária.
Mesmo com todas as dificuldades e desafios, Cunha diz que o momento nunca foi tão favorável para a educação: “Nós temos as Fundações de Amparo à Pesquisa com vários editais propondo melhoria de escolas e popularização da ciência, temos a participação ativa da Federação das Indústrias e empresariado, da comunidade científica com os INCTs, temos olimpíadas em quase todas as áreas do conhecimento e temos também sociedades científicas com participação expressiva na formação de docentes”, afirmou.
Ao final das apresentações, reuniu-se à mesa o grupo de relatores que ficará responsável por elaborar a lista de propostas e sugestões que farão parte da contribuição brasileira para os debates do Fórum Mundial de Ciência. Fizeram parte do grupo Lilian Guarieiro do Senai-Cimatec, Robert Verhine da UFBA, Núbia Moura Ribeiro do IFBA e Lys Vinhaes da UFRB. Educação, ética, novos materiais com foco nos renováveis, interação entre segurança alimentar e segurança energética, produção de resíduos e monitoramento de novos modelos, formação de agenda política para a ciência com foco em políticas de financiamento, e estratégias de sustentabilidade para todo o ciclo, desde o início da cadeia produtiva até a utilização do resíduo, foram alguns dos temas apontados pelos relatores. “Minha sugestão é que façamos dois documentos: o documento do Fórum Mundial e outro interno, para discussão das ciências no Brasil”, disse Lys Vinhaes.