A mesa-redonda “Recursos hídricos e mineração: lidando com os impactos” contou com a coordenação do engenheiro civil e hidráulico peruano Julio Kuroiwa, diretor do Laboratório Nacional de Hidráulica do Peru e responsável por centralizar as ações do Programa de águas da Rede Interamericana de Academias de Ciências (IANAS) em seu país. Além dele, participaram o engenheiro químico e de materiais Renato Ciminelli como relator, presidente do Conselho Consultivo do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia (INCT) Acqua, e os palestrantes Daniel Olago, professor do Departamento de Geologia da Universidade de Nairóbi, a engenheira química e Acadêmica Virgínia Sampaio Teixeira Ciminelli, professora do Departamento de Metalurgia e Engenharia de Materiais da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), e Marine Nalbandyan, presidente da ONG Grupo Ecológico Aquamarin.


Virginia Ciminelli, Renato Ciminelli, Daniel Olago, Julio Kuroiwa e Marine Nalbandyan


Desafios para a mineração

Membro da Academia Nacional de Ciências do Quênia e do International Lake Environment Committee (ILEC), Daniel Olago abordou as questões estratégicas e sistêmicas para todo o continente africano e desenvolveu estudos de caso para atividades e territórios mineradores de relevância em três países: a lavra de carvão na África do Sul e a extração de ouro na Tanzânia e Gana.

Segundo ele, os países africanos, diante da perspectiva de se tornarem alvos de vultosos investimentos em mineração nas próximas décadas, tanto por investidores do ocidente quanto pela China de forma avassaladora, “estão diante do grande desafio de gerenciar os crescentes conflitos no uso da água”. O continente possui as maiores reservas globais de minerais como a platina, o ouro, diamantes, cromita, manganês e vanádio, que são responsáveis pela contaminação da água disponível ao redor desses campos.

O desafio, a seu ver, é agravado pela importância da disponibilidade de água para o desenvolvimento da região, a baixa capacidade de armazenamento e tratamento dos recursos hídricos, os graves problemas sanitários e de doenças que dizimam a população de algumas regiões do continente, carência de recursos humanos e de sistemas de governança.

“O histórico belicista da região pode se tornar um fator indutor de uma posição mais proativa das empresas mineradoras em busca do licenciamento social como estratégia de aproximação aos stakeholders locais e harmonização de relações potencialmente tensas”, opinou. Como alternativa de recursos hídricos para as atividades de mineração, Olago deu destaque ao aproveitamento das águas pluviais, a reciclagem de efluentes de esgoto advindo de cidades próximas e águas subterrâneas.

Impactos da atividade

Diretora do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia de Minerais, Água e Biodiversidade e membro da Academia Brasileira de Ciências, Virginia Ciminelli trabalhou a análise do cenário brasileiro dos impactos da mineração sobre a disponibilidade de água e os recursos hídricos.

De acordo com sua abordagem, assistiu-se a um crescimento de mais de 500% na produção mineral brasileira nos últimos 10 anos. Pensando nisso, a nova fase do trabalho do Instituto Acqua expande a atuação macro das vanguardas cientistas para além dos processos industriais, com o intuito de qualificar os stakeholders territoriais da mineração como protagonistas das transformações que buscam o grande desafio: como harmonizar a produção mineral com a conservação de água e biodiversidade.

Por fim, Virginia salientou algumas propostas que se referem à ampla rede nacional e internacional do Instituto, que se transforma em um canal de trocas científicas, tecnológicas e políticas. A combinação de expansão urbana, operações de agrobusiness e mineração em larga escala criam pressões expressivas e crescentes sobre as fontes locais de água, biodiversidade e paisagem cultural. “Assim, estudos de casos de impactos de dimensão territorial e de inovações estratégicas que antecipam expectativas favoráveis de mediação e melhores práticas, visões otimistas de futuro que passam pelo desenvolvimento de modelos e uma melhor gestão a ser disseminada para outras regiões brasileiras são algumas possíveis intervenções a serem pensadas”.

Danos da indústria de mineração na Armênia

Em sua conferência, a armênia Marine Nalbandyan, membro da Associação Internacional de Ciências Hidrológicas (IAHS), ambientou o estágio atual de exploração mineral em seu país, com escalas produtivas comparativas ainda emergentes, desenvolvendo uma análise histórica do nível de contaminação química sobre importantes recursos hídricos relacionados à mineração.

Ela discorreu sobre uma grande variedade de parâmetros químicos e protocolos de amostras produzidas desde os anos do colapso da antiga União da República Socialista Soviética (URSS) até os tempos atuais. Os teores de metais pesados foram tomados como parâmetros integradores de uma análise mais estratégica que aponta com a crescente industrialização para valores acima dos limites aceitáveis. “Isso antecipa, pela riqueza de depósitos não ferrosos, que a infraestrutura analítica e de monitoramento instalada será muito útil no licenciamento de novos empreendimentos que inevitavelmente serão implantados com a queda dos teores de minerais nos depósitos em escala mundial”, disse. “Os grandes investidores e países importadores buscam novas fontes de minerais nas regiões menos convencionais”.

Uma bacia hidrográfica, de acordo com Marine, acaba recebendo dejetos industriais, das cidades próximas e de meios de plantio. Estudos apontam que durante a URSS o nível de metais pesados era baixo. No entanto, o período de estabilização industrial foi caracterizado por um crescimento abrupto da poluição superficial dos recursos hídricos disponíveis no país. “Isso ocorreu principalmente no Rio Voghchi e arredores, onde taxas de metais pesados extremamente altas e danosas ao ser humano surgiram”, concluiu.