A ciência pode ser observada de vários ângulos: ora como uma forma especializada de estudo, ora como um agente prático e um fator cultural. Apresentado pela Acadêmica Regina Pekelmann Markus, o vice-presidente da Academia Brasileira de Ciências, Hernan Chaimovich Guralnik, palestrou durante a sessão “Ciência e universidades”, realizada em 27/7, último dia da 64ª Reunião Anual da SBPC.


Regina Pekelmann, Hernan Chaimovich e Umberto Cordani

Bioquímico e professor titular do Instituto de Química da Universidade de São Paulo (USP), Chaimovich afirmou que a ciência pesquisa a realidade observável, definida pela comunidade de cientistas. A seu ver, um princípio que caracteriza um cientista é o do prazer individual. “Existe também uma liberdade de questionar o que é e o que não é pesquisável. O grupo de pares se estrutura através da ética eficiente, necessária para caracterizá-lo dentro do sistema”, explicou.

No entanto, de acordo com ele, “a liberdade de praticar ciência é tão duramente conquistada e tão difícil de preservar como qualquer outro tipo de liberdade”. Segundo uma declaração do Conselho Científico Internacional (ICSU, na sigla em inglês), os cientistas, atualmente, não podem mais se dedicar exclusivamente à procura do conhecimento sem reconhecer sua responsabilidade social. “A ciência permite modificar a natureza e influenciar a sociedade. Antes de tudo, somos cidadãos”, disse.

Como a ciência é uma forma de pensar, avaliar , decidir e fazer, o Acadêmico salientou que o ato de pensar como um cientista pode ser um elemento importante para a democracia. Para isso, a população precisa estar bem informada, saber opinar sobre as decisões e mostrar sua voz. “Vejamos a discussão sobre células-tronco, por exemplo, e o debate sobre o uso de alimentos transgênicos, que não foram adequadamente esclarecidos com a sociedade quando surgiram. Ainda hoje existem pessoas pouco envolvidas”.

Ciência e universidade no Brasil

De acordo com o gráfico abaixo mostrado durante a conferência, existem quatro países que somam três aspectos importantes: dimensão continental, produto nacional bruto acima de U$S 400 bilhões e população superior a 100 milhões de habitantes. São eles: Brasil, China, Estados Unidos e Rússia. Para o Acadêmico, nascido em Santiago, no Chile, e vivendo no Brasil há 43 anos, esses fatores bastam para apreciar o tamanho da responsabilidade de cada brasileiro(a). “Somada a isso, vem a contribuição científica brasileira em nível mundial, crescente nos últimos anos”, lembrou.

Nesse cenário, Chaimovich destacou que existem condições para que a pós-graduação brasileira seja de excelência, embora muitos fatores não sejam adequadamente discutidos como, por exemplo, a concentração de talentos, a formação de mestres e doutores, a transferência de tecnologia, a gestão do sistema educacional, entre outros temas. “A estratégia de internacionalização da nossa ciência não tem funcionado e a percentagem de trabalhos científicos em colaboração com outros países vem caindo e é muito menor quando comparada a outras nações”, observou.

Outro problema destacado pelo Acadêmico é a distribuição de pesquisadores pelas diferentes regiões, o que não é nem um pouco homogêneo. Além disso, as estruturas institucionais das universidades atrapalham a interdisciplinaridade, questão amplamente defendida atualmente. Para ele, os desafios são intensificar as atividades de pesquisa, desenvolvimento e inovação, bem como internacionalizar a área e estender a excelência para as demais regiões.

Chaimovich defende a transformação de algumas universidades brasileiras em universidades de classe mundial, a exemplo das universidades de Chicago e de Stanford. Nelas, um departamento, centro, grupo ou personalidade é reconhecido internacionalmente como sendo de excelência, com qualidade e moderno. No entanto, ele atenta para o fato de que a ideia, para ser atingida, poderia desviar recursos e energia de metas mais importantes – e talvez mais realistas. “Essa meta poderia concentrar-se em demasia na construção de uma universidade de pesquisa orientada à elite em detrimento da expansão do acesso ou das necessidades nacionais”, alertou.

Internamente, esse patamar tem um grau significativo de autogovernança, o que assegura que a comunidade acadêmica tenha controle sobre a admissão de estudantes, currículos, critérios de seleção etc. “Uma universidade de classe mundial também tem a responsabilidade de avaliar a eficiência do aprendizado, não somente pelas provas ao longo do curso, mas, acima de tudo, pelo processo de ensino/aprendizagem”, concluiu Chaimovich, lembrando que o aluno não recebe somente um diploma: ele passa por um processo de ganhos, acúmulo de conhecimento e formação de valores e posturas.