“A educação básica no Brasil é precária.” A afirmação foi consensual entre os palestrantes que participaram do debate sobre a “Realidade da Educação Básica no Brasil”, realizada na quinta-feira, dia 26 de julho, na 64ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC).
O Brasil no PISA
O pesquisador Cesar Zucco (UFSC), representante da Sociedade Brasileira de Química (SBQ), iniciou sua apresentação com um diagnóstico histórico da educação de base no país. “Quatro séculos e meio de total abandono e uma melhora nos últimos 50 anos derivaram na má qualidade do ensino básico brasileiro”, afirmou Zucco.
Ele mostrou dados do Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (PISA, na sigla em inglês), realizado pela OCDE/UNESCO, que pretende medir a capacidade que jovens de 15 anos tem em usarem seus conhecimentos para enfrentarem desafios da vida real. No ranking internacional de 2003, por exemplo, o Brasil atingiu a última posição. Já em 2009, quando 65 países participaram da avaliação, o Brasil ficou na 53ª colocação. Houve evolução, mas a diferença ainda é grande em relação à maioria dos outros países participantes.
O resultado do PISA é dividido em cinco níveis, sendo que o primeiro é o mais fácil, de ações mais óbvias, no qual é cobrada do estudante a identificação de respostas que estão no próprio enunciado das questões. O último e mais difícil é o nível 5, no qual é exigido do aluno a formulação de respostas a partir de reflexões e argumentações. O Brasil, em 2009, não teve nenhum aluno neste nível. “Será que as escolas estão preparando os alunos para a vida?”, questionou o pesquisador.
Sobre a diferença de posição no ranking do PISA obtida pelo Brasil em relação aos outros países, o pesquisador fez algumas considerações importantes, principalmente no âmbito da valorização do trabalho do docente, uma vez que, em seu ponto de vista, “a profissão de professor perdeu todo o encanto”. Em outros países os professores são muito bem preparados e recebem salários que variam de seis a oito mil reais mensais, enquanto que no Brasil o piso salarial de professores atinge pouco mais de mil reais. Além disso, Zucco ressaltou a importância de um estímulo para a formação continuada dos professores, pois “não há como melhorar a educação se não mudarmos a forma de lidar com o professor”.
A rotatividade docente no ensino básico foi criticada pelo palestrante, que afirmou que pela política educacional no país não se tem o hábito de um programa continuado, no qual professores acompanhariam por quatro ou cinco anos a formação intelectual e social dos alunos, como acontece em países desenvolvidos. “Os professores brasileiros precisam aprender a ensinar, pois as nossas licenciaturas não estão dando o apoio necessário, sabem muito de teorias pedagógicas, mas não sabem o que fazer em sala de aula”, afirmou Zucco.
O pesquisador terminou sua apresentação comentando sobre a necessidade de uma política de ensino e de investimento em educação. Atualmente são investidos 5% do PIB, “que é muito, mas onde esta esse investimento, qual o efeito real que esse dinheiro tem na educação?”. Ainda sobre a falta de investimentos, o pesquisador questionou “como um país que pretende crescer tem os políticos mais caros do mundo e os professores mais baratos?”.
A situação da Matemática
Vanderlei Horita (Unesp), representante da Sociedade Brasileira de Matemática (SBM), prosseguiu a apresentação reiterando o diagnóstico feito pelo colega da SBQ. “É dever do Estado investir no professor, por ele ser o fator principal do ensino.” Ele continuou com uma crítica a falta de visão dos governantes em relação às políticas educacionais. Além disso, Horita afirmou ser necessária maior transparência na gestão educacional, uma vez que os dados educacionais que o governo produz e divulga são confusos para que a sociedade os entenda. Nesse sentido, há uma distorção sobre a real situação da qualidade do ensino básico.
A distorção também está na estrutura educacional que se mantém de forma elitista. “Pobre cursa o ensino básico em escolas públicas e entra em universidades privadas, enquanto que o rico cursa em escola privada o ensino básico e ingressa em universidades públicas”, afirmou Horita.
A defasagem na metodologia de ensino também foi abordada pelo palestrante, quando afirmou que os professores repetem o modelo pelo qual aprenderam. Um modelo ultrapassado. “Se os professores, principalmente de matemática, fizerem uma análise dos livros didáticos perceberão que contêm erros conceituais gravíssimos”, alertou.
A experiência da Física
Por que é importante ensinar ciência? Rita de Almeida (UFRGS), representando o Acadêmico Celso Pinto de Melo, presidente da Sociedade Brasileira de Física (SBF), iniciou a sua palestra respondendo a questão. Além de ser importante para que a sociedade tenha cientistas, ensinar ciência é “dar a possibilidade das crianças se maravilharem com o mundo, e isso é um direito de todos”, afirmou Rita.
A pesquisadora diferenciou o ensino de ciência das outras áreas, como por exemplo, da arte, no qual é possível decidir em ensinar Modigliani ou Picasso. A diferença é que na física é preciso ensinar cálculo e geometria – e corretamente, pois “nessas áreas as conseqüências do mau ensino são graves, os edifícios e os aviões podem cair”, ironizou Rita, ao enfatizar a necessidade de priorizar estudos de ciências.
Quanto à qualidade da educação no ensino médio, ela acredita que se o país continuar com a pequena carga horária para o ensino de física em escolas públicas, de duas horas por semana, “chegará a uma situação de pobreza maior”. Segundo ela, os países que saíram da situação de pobreza apostaram muito no estudo e desenvolvimento científico. “Nós precisamos educar cientificamente os professores: o significado de ciência não é substituível. Esse significado deve estar na estrutura do ensino fundamental”, concluiu.
Evasão na Computação
Em poucas palavras, computação é a busca de solução para problemas a partir de entradas, que depois de trabalhadas em algoritmo apresentam resultados. “Muito antes de existirem os computadores, essa ciência já era executada com caneta e pap
el ou mentalmente. Quase todo grande desafio encontrado no mundo está procurando solução através da computação”. Foi com esses argumentos que Mirella M. Moro (UFMG), diretora de educação da Sociedade Brasileira de Computação (SBC), iniciou sua fala.
Computação é uma ciência diferente das outras debatidas anteriormente na mesa, porque ainda não está em nenhum currículo do ensino básico. Por isso, Mirella se ateve à situação do ensino superior em Computação, que se divide em cursos superiores de tecnologia, geralmente de dois anos, e cursos de graduação.
Segundo dados do Ministério da Educação (MEC), em 2010 havia 2.173 cursos de computação – de tecnologia e de graduação. Desses cursos deveriam ter se formado 250 mil profissionais, mas apenas 45 mil concluíram o curso superior. Para Mirella, os motivos da evasão são muitos, indo desde questões familiares até a falta de informação prévia sobre o curso. “Muitos acham que vão entrar e ficar jogando, editando imagens, mas não é nada disso, há muitas disciplinas teóricas”, disse. Além desses motivos, há também àqueles que, devido ao aquecimento do mercado de TI (tecnologia da informação), começam a trabalhar e desistem do curso por achá-lo desnecessário. “Isso é o maior engano cometido pelos alunos”, lamentou Mirella.
Iniciativas das Sociedades
Durante as apresentações, os representantes das Sociedades Brasileiras de Química (SBQ), de Matemática (SBM), de Física (SBF) e de Computação (SBC) mostraram ações que estão desenvolvendo para melhorar a educação no ensino básico, nas áreas correspondentes.

César Zucco, da SBQ: sessão lotada
Todas as Sociedades realizam olimpíadas nacionais e mantém sites atualizados com conteúdos para estudantes e professores. A SBQ realizará em outubro deste ano o 8º Fórum Nacional de Coordenadores de Cursos de Graduação em Química e o Fórum Nacional de Coordenadores de Programas de Pós-graduação em Química, que têm o objetivo de discutir a formação dos alunos na área de Química. Além disso, ela também mantém o site Qnint, onde são disponibilizados materiais de alto nível dedicados aos estudantes e professores.
Já a SBM, junto com alguns alunos do Mestrado Profissional em Matemática em Rede Nacional (Profmat), que se dedicam a desenvolver material para apoio pedagógico durante o mestrado, disponibiliza esse material aos professores. A SBF, que além da olimpíada de física e da publicação de uma revista voltada para o professor, também está construindo um Mestrado Nacional Profissional em Ensino de Física, que exigirá dos candidatos que queiram participar a formação em alguma área afim e que lecionem em alguma escola.
Por fim, a SBC, que também realiza a sua olimpíada, está preparando a Cartilha da Computação para suprir a falta de informação sobre os cursos superiores na área. O material será distribuído gratuitamente em todo o Brasil, visando esclarecer o que é computação e assim atrair talentos para a ciência.