O sucesso da implementação de condutas sustentáveis em nível mundial depende da ciência, e a ciência precisa de mulheres. Essa foi a mensagem da mesa de debates sobre a participação da mulher no meio científico, que integrou as atividades do Fórum realizado na PUC-Rio. O objetivo era mostrar quais são os principais desafios ainda enfrentados pelo público feminino para entrar e permanecer na área.
O encontro contou com a presença da pesquisadora da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) Mariana Vieira, laureada do prêmio Loreal-ABC-Unesco Para Mulheres na Ciência 2011; Indira Nath, do Instituto Nacional de Patologia da Índia; Ameenah Fakim, membro do comitê do Escritório Regional para a África do Conselho Científico Internacional (ICSU-ROA); Sonia Bahri, chefe da Seção para Cooperação Internacional em Educação Superior da Unesco; Belita Koiller, física e membro titular da Academia Brasileira de Ciências (ABC); Lilliam Alvarez Diaz, ex-ministra de Ciência, Tecnologia e Meio Ambiente (C,T&MA) de Cuba; Alice Abreu, do Comitê Regional para América Latina e Caribe do ICSU; e a jornalista Luisa Massarani, diretora do Museu da Vida da Fundação Oswaldo Cruz (MV-COC/Fiocruz).
Lilliam Diaz, Alice Abreu e Luisa Massarani
Segundo Sonia, as mulheres ainda constituem uma parcela pequena dentro da área e poucas detêm posições de destaque. Ela afirmou que a igualdade de gênero é uma das prioridades da Unesco e apresentou o vídeo institucional sobre o prêmio Para Mulheres na Ciência, presente no Brasil desde o ano de 2007, em parceria com a LOréal e a Academia Brasileira de Ciências.
A jornalista Luisa Massarani, coordenadora da região da América Latina e Caribe do portal SciDev.Net, mediou as perguntas direcionadas às palestrantes da mesa, questionando, inicialmente, quais são as contribuições da mulher para o desenvolvimentos sustentável. Para Lilliam Diaz, elas são peças cruciais nesse debate. “A dignidade humana está muito interligada com o conceito de bem-estar e a figura da mulher envolve isso, já que em muitos lares ela representa o equilíbrio da família”, ressalta.
Em Cuba, Diaz foi ministra de C,T&MA por oito anos, destacando que há setores do país em que a presença feminina não é forte – o que não se aplica à ciência, composta por 66% de mulheres. “Não é incomum enfrentarmos preconceitos em posições de cargos mais altos, mas o importante é mantermos nossas convicções e vontade de mudança, mostrando que temos capacidade”, opinou.
Já a Acadêmica Belita Koiller frisou que durante seu doutorado em Física na Universidade de Berkeley, na California, em 1975, muitas mulheres já assumiam cátedras na instituição, o que no Brasil ainda não ocorria com frequência. “Programas como o da Loreal-ABC-Unesco mostram como existem alternativas gratificantes para as mulheres no Brasil e que a física também pode ser feita por nós”.
Para Indira Nath, que se formou médica na Índia, a dificuldade em se tornar uma cientista numa nação em desenvolvimento também tem a ver com a competitividade dos países industrializados, reforçando que o ideal é fazer frente a esse conhecimento. “Em geral, as mulheres não escolhem as chamadas ciências duras, como matemática, engenharia e física, mas podemos e devemos quebrar esse estereótipo”.
Em seu país, os programas científicos têm ganhado destaque, indo além da pesquisa de laboratório e academicista. Por conta disso, as mulheres passaram a enxergar o lado mais humano e aberto da ciência, o que as atraiu para o ramo. “Não me esqueço nunca quando tive meu primeiro artigo publicado, foi um dos momentos em que me senti mais realizada”, recordou.
Apenas na primeira fileira, da esq. para dir., Mariana Vieira, Belita Koiller, A
lice Abreu, Sonia Bahri, Ameenah Fakim, Indira Nath e Luisa Massarani
Nas palavras da mauriciana Ameenah Fakim, “por trás de todo homem bem sucedido existe uma mulher e atrás de toda mulher nessa situação existe uma família”. Contudo, ela reconhece que as tarefas domésticas precisam ser compartilhadas. “Precisamos da decisão das mulheres dentro da ciência para agregar valor aos debates”, complementa.
Em seguida, Alice Abreu fez um pequeno discurso, destacando que as quatro mulheres eram exemplos dos desafios encarados pela sociedade feminina em nível mundial, entre eles a conciliação entre carreira e família e o fortalecimento de pesquisas sobre igualdade de gêneros. “A promoção da divulgação científica entre jovens é essencial para que as meninas tomem gosto pelas carreiras científicas desde pequenas”, observou Abreu.
Outro ponto levantado por ela foi o fato de muitas brasileiras conseguirem se formar mestres e doutoras, mas, ainda assim, tão poucas assumirem os cargos mais altos no meio científico. “Foi uma vitória a eleição da primeira presidente mulher de nossa história, mas nunca vi personalidades femininas nas chefias das agências de fomento, na Academia Brasileira de Ciências ou até mesmo ocupando a pasta de C,T&I”, lamentou Alice Abreu.
Por fim, a laureada Mariana Vieira apresentou alguns detalhes de sua pesquisa premiada, que é direcionada ao controle de metais, como sódio e potássio, em amostras de biodiesel. O projeto visa o desenvolvimento de métodos de análise para controle de quantidade da glicerina resultante da produção de biodiesel no Brasil, para que ela possa ser aproveitada como matéria-prima pelas indústrias de cosméticos e alimentos. “Essa glicerina, sem destino adequado, torna-se um problema para o meio ambiente”, concluiu Vieira, lembrando o papel da química verde no contexto do desenvolvimento sustentável.