No ano de 2012, o Brasil vem enfrentando simultaneamente três grandes anomalias climáticas: duas grandes secas, uma no Nordeste e uma no Sul, e um registro histórico de inundações na bacia do rio Amazonas. As causas, em grande parte, são advindas do aquecimento global, mas há também outros fatores em jogo, como a rápida urbanização.
Essa avaliação foi apresentada pelo Acadêmico Carlos Nobre, secretário de Políticas e Programas de Pesquisa e Desenvolvimento do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), durante o debate sobre clima e outras mudanças ambientais no Fórum de Ciência, Tecnologia, Inovação e Desenvolvimento Sustentável, realizado entre os dias 11 e 15 de junho na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio).
O evento, realizado pelo International Council for Science (ICSU) em parceria com a ABC, a Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura (Unesco), o International Social Science Council (ISSC), a World Federation of Engineering Organizations (WFEO/FMOI) e o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), serviu como base de reflexão sobre problemas e soluções a serem discutidos na Conferência Rio+20.
Nobre comentou que algumas contribuições do Fórum estarão no relatório do Painel Brasileiro de Mudanças Climáticas que será publicado durante a Rio+20. Esse é o primeiro volume de três, a serem publicado por iniciativa conjunta do MCTI e do Ministério do Meio Ambiente. O secretário também disse que, em geral, países pobres têm uma capacidade muito menor de absorverem qualquer tipo de choque, inclusive choques climáticos ou ambientas. No contexto global, segundo ele, o Brasil se encontra entre os países de vulnerabilidade média. “Não podemos nos esquecer que hoje no Brasil uma grande parte do PIB vem da agricultura, da energia renovável, da água, de biocombustíveis e do vento. Nesse sentido, portanto, nossa economia é especialmente vulnerável”. Por fim, Nobre ressaltou a importância de ações internacionais coordenadas “para integrar soluções e aumentar a capacidade de monitoramento global, particularmente nos países do sul”.
Projeções científicas
Seguindo o objetivo do debate, de apresentar as compreensões científicas mais atuais sobre a dinâmica de processos do Sistema Terra relacionados às atividades humanas, a segunda palestrante, Carolina Vera, diretora do Centro de Investigaciones del Mar y la Atmosfera (CIMA), destacou a importância da maior participação dos cientistas dos países em desenvolvimento na discussão e atividades em torno das mudanças climáticas.
Ela apresentou dados do documento Regional Climate Change Índex (RCCI) sobre os focos de calor que surgem no Brasil, cobrindo a porção oeste da região nordeste, do noroeste do estado de Minas e também as regiões Centro-Oeste e Norte, exceto o nordeste do estado do Pará e do Amapá. Além disso, Vera afirmou que é um fato comprovado por observações científicas que o clima está mudando rapidamente no Brasil.
Por fim, ela recomendou que a comunidade de pesquisa sobre a mudança climática global deve construir capacidade científica suficiente para projetar, ajudar a realizar e defender pesquisas de observações globais do sistema de clima. Vera concluiu afirmando que, para assegurar a importância e aumentar o uso da informação sobre o clima, “os cientistas e os responsáveis pelas decisões devem trabalhar juntos nos projetos e na geração de informações necessárias, o que exige uma aproximação interdisciplinar frente aos desafios do sistema cientifico da relação Terra/clima.”
Mudanças climáticas nos oceanos
O gás carbônico (CO2) também está ligado à acidificação e ao aquecimento dos oceanos. Foi o que afirmou o chefe da seção de Ciência Oceânica, da Comissão Intergovernamental Oceanográfica (IOC), Luis Valdés, durante sua apresentação no evento. Segundo ele, atualmente os oceanos são mais ácidos do que foram nos últimos 800 mil anos e a previsão é que até 2100, 70% dos corais sejam expostos a águas corrosivas. “Os níveis crescentes de acidez reduzem a capacidade futura dos oceanos de absorver dióxido de carbono, deixando assim mais emissões na atmosfera”, explicou o cientista.
Valdés reafirmou que o aquecimento global é um fato confirmado e que deve ser o centro de interesse ambiental de nossa época. “Mais pesquisas devem ser feitas para compreender inteiramente e avaliar os impactos das mudanças climáticas nos oceanos e assim podermos monitorar os efeitos do aquecimento e acidificação dos oceanos”, afirmou.
O pesquisador concluiu sua apresentação no Fórum destacando a necessidade de se exigir posições proativas dos políticos pelo respeito ao uso sustentável e o manejo adequado dos recursos naturais. “Também é preciso que eles se posicionem intensamente em prol da mitigação dos impactos do aquecimento global, além de ser preciso suprir a falta de dados sobre o assunto no hemisfério Sul.”
Mitigação
A mudança climática está definindo uma redução na capacidade da América Latina produzir energia renovável, de acordo com Roberto Schaeffer, especialista em planejamento energético da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Ele afirmou que muitos tipos de energia renovável são vulneráveis a variações do clima, devido à sua dependência da água, do vento e do sol. “A biomassa do Brasil, hidrelétricas e energia eólica são particularmente vulneráveis”, destacou Schaeffer, dando como exemplo o fornecimento de eletricidade no Nordeste do Brasil, que seria afetado por um aumento na seca. Também afirmou que a produção de soja, que é fonte de energia renovável, seria impossível devido ao aumento das temperaturas. A única boa notícia é que, como na
s áreas costeiras do Brasil há muito vento, a ampliação da geração de energia eólica seria adequada.
A solução para o problema, segundo Schaeffer, seria investir em outras formas de geração de energia, também renováveis, e interligar os sistemas, para garantir a distribuição. “A energia renovável é mais vulnerável em relação às formas convencionais de energia e os países devem levar isso em conta nos seus planos de desenvolvimento”, concluiu.
Adaptação
A mudança climática trouxe aos cientistas a necessidade de prevenir os impactos ambientais e também de preparar a população contra os efeitos adversos desses impactos. Segundo Diana Liverman, uma das diretoras do Instituto do Meio Ambiente da Universidade do Arizona, nos Estados Unidos, existe um campo de pesquisa conhecido como “adaptação” que precisa crescer.
Ela explicou que a adaptação está ligada às técnicas necessárias para lidar com os impactos ambientais, diferentemente das técnicas de mitigação, que buscam uma forma de combater o avanço do aquecimento global, como a redução de emissão de gases estufa. Liverman ressaltou a importância dos dois campos da ciência trabalharem juntos.
Além disso, segundo ela, é necessário identificar a vulnerabilidade de forma precisa, para que assim sejam pensados métodos de adaptação diferenciados, em vários aspectos. Por fim, a pesquisadora alertou que se as emissões de gases estufa não diminuírem, os impactos se tornarão cada vez mais severos e há limites para a adaptação. “Se não fizermos algo para reduzir as emissões, podemos encarar um planeta tão mais quente que seria impossível a adaptação”, concluiu.