Médicos de 11 Academias de Medicina das Américas se reuniram no Rio de Janeiro durante o Workshop Regional sobre Doenças Não-Transmissíveis – Prevenção e Controle de Doenças Cardiovasculares e Câncer. Durante o primeiro dia do evento, o Acadêmico Eduardo Moacyr Krieger (na foto com o presidente da ABC, Jacob Palis), um dos organizadores, falou sobre a importância da integração das academias através do esforço da Federação de Academias de Medicina. “O fato relevante, ao pensarmos este evento, foi promover a união e a colaboração entre as academias do hemisfério. A ideia é discutirmos as doenças não-transmissíveis, como as cardiovasculares e alguns tipos de câncer. Não tem sentido que as academias não colaborem entre si e não saibam o que se faz em cada país”, disse Krieger.

Os pesquisadores Marcelo Elizari, da Argentina, Luis Alberto Maldonado, da Bolívia, Benjamin Stockins, do Chile, Trevor Alleyne, de Trinidad Tobago, coordenados pela malasiana Lai-Meng Looi, abordaram aspectos relativos às doenças cardiovasculares em seus países, os fatores de risco como tabagismo, sedentarismo e alimentação inadequada, quais estudos epidemiológicos são conduzidos, as políticas adotadas e o que mais deveria ser feito para reduzir os índices de mortalidade pela doença. Um dos exemplos discutidos foi o da Bolívia. Embora no país as doenças cardiovasculares sejam a terceira causa de morte, nos últimos dez anos o número de pacientes quadruplicou.

Também participou dos debates iniciais o ex-ministro brasileiro da saúde Adib Jatene, que iniciou sua conferência mostrando a importância epidemiológica das doenças cardiovasculares tanto no Brasil, onde é responsável pela maioria dos óbitos, como também no mundo. Por isso, segundo ele, as medidas de prevenção são fundamentais, especialmente para os indivíduos de alto risco. “Neste campo, existem alguns mitos que precisam ser desfeitos. Primeiro, que são problemas apenas de países desenvolvidos. Segundo, que é um problema de saúde de pessoas ricas. E terceiro, que as doenças infecciosas afetam mais que as doenças cardíacas. Essas três alternativas são falsas”, afirmou.

Ele também apresentou dados da Organização Mundial da Saúde, mostrando que as 17 milhões de mortes que ocorrem no mundo pelas doenças cardiovasculares representam 30% dos óbitos anuais – maior do que a soma das mortes por AIDS, doenças pulmonares e câncer. “Se não forem tomadas atitudes para reverter esse quadro, em 2020 estaremos diante de uma verdadeira epidemia”, disse o médico. O perfil de risco para tais doenças tem aumentando com a urbanização, o estresse emocional, o tabagismo, a dieta gordurosa e a diminuição de atividades físicas.

Para encerrar o dia, o Acadêmico José Rodrigues Coura fez uma conferência intitulada “Amazônia brasileira: uma nova fronteira para a saúde e educação”. Um dos grandes problemas da região, segundo ele, é a ocupação desordenada com uma migração de pessoas de diferentes culturas, o que dificulta ainda estratégias de saúde e educação, além do risco de desertificação e a cobiça internacional. Coura falou sobre os desafios em uma região de cinco milhões de quilômetros quadrados que representam 58% do território brasileiro, onde ainda há o maior complexo fluvial do mundo. “A água doce é o diamante do futuro”, constatou.

Para o presidente da Academia Nacional de Medicina Marcos Moraes (à esquerda na foto com Barcinski), mediador da sessão de Coura, é preciso rever métodos de estratégia na Amazônia. “O ideal é que cada macrorregião do país tenha uma prevenção e uma profilaxia. A chave de tudo é o estímulo de vida, mas como você vai ensinar novos hábitos a uma pessoa que vive dentro da floresta? Isso envolve um estudo detalhado e delicado”, disse. Já para o Acadêmico Marcello Barcinski, que atuou como relator da sessão, a região é um patrimonio nacional, porém os assuntos ligados a ela são de interesse global. Coura mostrou as várias intervenções, propondo uma rede de instituições de saúde primárias e secundárias, pois existe uma dispersão da população e, com isso, um difícil acesso ao sistema de saúde. Ele também frisou a necessidade de se aumentar o número de navios-hospitais e os transportes aéreos, para que possam chegar com rapidez aos locais necessários.

Durante sua exposição, o Acadêmico falou sobre as várias incursões de saúde àquela região desde Oswaldo Cruz (1910-1912) e Carlos Chagas (1912-1913) até as décadas mais recentes, quando a Fundação Oswaldo Cruz implantou inicialmente um escritório na região, em 1994 e, posteriormente, o Centro de Pesquisas Leonidas e Maria Deane. O pesquisador ainda abordou a implantação de um laboratório por seu grupo de pesquisa há 20 anos em Barcelos, município brasileiro no interior do Amazonas. “Naqueles tempos, malária, leishmaniose, a purú-purú – uma doença desconhecida -, sífilis, lepra, ancilostomose, o mal das cadeiras – que não se vê mais -, desinterias e relatos sobre alcoolismo eram muito comuns”, disse. “Nos dias atuais, as enfermidades que persistiram foram a malária, gastroenterites, leishmaniose e alcoolismo, sendo este um problema grave de saúde, e outras atuais como a dengue, oncocercose, hepatites virais, entre outras”.

Por fim, abordou a importância de projetos de vigilância como o Sistema de Vigilância da Amazônia (Sivam) e o Sistema de Proteção da Amazônia (Sipam) e concluiu com propostas para uma educação em saúde mais eficiente, com reciclagem dos professores e engajamento das universidades estaduais, descentralizando o ensino para regiões mais remotas. “Ou seja, um projeto educacional inspirado em Paulo Freire, visando as características da região Amazônica.”