“O dia mais belo? Hoje. A coisa mais fácil? Errar. O maior remédio? O otimismo. Os melhores professores? As crianças.” Essas são algumas frases do Poema da Paz, de Madre Teresa de Calcutá, pintado nos degraus da escada principal do Colégio Estadual José Martins da Costa. Os versos indicam os valores cultivados no dia a dia da escola, que fica em São Pedro da Serra, município de Nova Friburgo, no estado do Rio de Janeiro.

Refletindo esses valores, que reafirmam a importância da persistência, da esperança e da confiança no ser humano, foi inaugurado em 19 de novembro de 2011 o Espaço de Ciências Prof. José Fernando Silva Mello, laboratório que carrega o nome do antigo diretor da escola e idealizador do projeto, falecido em 8 de janeiro de 2012. Essa realização foi possibilitada pela iniciativa do Acadêmico Emiliano Horacio Medei e apoio da Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj) – cujo diretor-científico, o Acadêmico Jerson Lima, compareceu ao evento de inauguração do laboratório, visto na foto acima.

Medei, Membro Afiliado da ABC desde 2011 e pesquisador do Laboratório de Eletrofisiologia Cardíaca do Instituto de Biofísica da Universidade Federal do Rio de Janeiro (IBCCF/UFRJ), juntou recursos de dois editais da Faperj: um de Difusão e Popularização da Ciência e Tecnologia e o programa Apoio à Melhoria do Ensino das Escolas Públicas Sediadas no Estado do Rio de Janeiro. O objetivo era aumentar o estímulo para as aulas de cunho científico, incentivar os alunos para as áreas científicas no processo da escolha profissional e aproximar a universidade da escola.

“Temos que desmitificar a ideia de que a universidade é algo inatingível, especialmente entre os alunos de zona rural. Eles têm que enxergar a universidade como uma meta perfeitamente possível de ser alcançada”, ressalta a diretora Gleici Herenger, de 41 anos, que há 36 acompanha a trajetória do colégio. Sua mãe foi merendeira da escola e Gleici estudou lá desde o pré-escolar, tendo sido da primeira turma de ensino médio. Há um ano na direção da escola, Gleici mantém seus dois filhos estudando lá. Em 2011, ela encampou a proposta do Prof. Emiliano e diz que já percebe mudança em alguns alunos, que, com o incentivo das atividades do laboratório, passaram a refletir mais sobre a questão da escolha profissional. “Foi um grande presente para todos que trabalham aqui e querem ver o bem desses meninos e meninas”. O empreendimento envolveu também as regiões de Lumiar e Varginha Alta, ou seja, beneficia os alunos de três povoados.

O Prof. Medei (entre dois alunos, na foto ao lado) explicou o desenvolvimento do projeto. Na primeira etapa, os alunos foram levados às instalações do Centro de Ciências da Saúde (CCS) da UFRJ para que pudessem observar o dia a dia dos pesquisadores e entender como o método científico é aplicado em um laboratório. Ao mesmo tempo, alguns professores universitários passaram a fazer palestras em colégios da região, apresentando aos alunos as diversas áreas da Ciência. “Nessas palestras, eu via o brilho nos olhos dos alunos. Foi então que surgiu o edital de apoio e melhoria das escolas públicas, lançado pela Faperj, que nos ajudou a construir o laboratório dentro da escola, com grande apoio da diretora, professores, pais e alunos.”

Para a manutenção do laboratório, os docentes Laércio Azevedo de Aguiar (à esquerda na foto), de biologia, e Evanil Ribeiro da Silva (à direita na foto), de química, junto com a diretora da escola e a equipe planejam mobilizar a comunidade para a organização de eventos, tendo como objetivo arrecadar recursos para as demandas do laboratório -, que possui estufa bacteriológica, três microscópios de alta resolução, centrífuga, agitador, geladeira, estoque de sais e reagentes, entre outros equipamentos.

Espaço de pesquisa favorece a multidisciplinaridade

Medei relata então a segunda etapa do desenvolvimento do projeto: a criação do primeiro curso de férias, realizado em janeiro de 2011 com o tema “propriedades dos alimentos”. Foram abertas 20 vagas para o curso. “Para a nossa surpresa, recebemos 35 inscrições”, conta Medei. Os estudantes selecionados puderam colocar em prática a formulação de hipóteses que viram durante as visitas à UFRJ. O Prof. Evanil comenta que nas aulas “normais”, em sala de aula, muitas vezes o professor percebe uma desmotivação nos alunos. “Aqui, fazendo experimentos em tempo real, eles precisam ficar atentos o tempo todo e estão demonstrando muito entusiasmo. Ninguém falta, ninguém se atrasa, ninguém quer sair mais cedo…”.

Na interface entre ensino médio e universidade, três ex-alunos que terminaram o 2º grau nos colégios locais e que estão no início da faculdade de Biologia, em Nova Friburgo, voltaram como participantes e “trainees” de monitor do curso de férias. Michele Pereira de Souza (à esquerda na foto), Viviane Fernandes (à direita) e Bernardo Lima receberam treinamento da UFRJ, junto com os demais professores envolvidos, e foram convidados a participar dos próximos cursos também como monitores. “Eles mesmos sugeriram a possibilidade de começarem a realizar uma pesquisa de campo e análise de dados no laboratório. Não só para a escola, como também para suas respectivas monografias e outros trabalhos”, relata Medei.

Os professores afirmam que o novo espaço enriquece todas as disciplinas, abrindo novas oportunidades pedagógicas dentro do cotidiano escolar. O Prof. Laércio acrescenta que existe a intenção de retomar pesquisas antes desenvolvidas, mas que tinham a parte laboratorial terceirizada. “É o caso do nosso estudo de análise das águas da região. Fazíamos a coleta e enviávamos a laboratórios de fora para a análise das amostras. Agora, com o laboratório, é perfeitamente viável fazermos as análises aqui”, esclarece. Já o Prof. Evanil conta que dava aula no pátio da escola e trazia os reagentes de casa para fazer demonstrações. “A questão do despertar do interesse vocacional do aluno para a área de química se torna complicada sem um espaço adequado para experimentos. Neste novo centro, os alunos poderão testar se é aquilo mesmo que querem seguir como carreira”, acentua.

Testando hipóteses na prática

No início do curso de férias, os estudantes se dividiram em quatro grupos, sendo cada um acompanhado por um monitor, todos membros do laboratório de Medei ou colegas seus na UFRJ – mestrandos, doutorandos e até pós-graduandos. Ao final do dia, os grupos se reuniam para discutir os resultados encontrados, o que dava espaço para o debate e para a construção de novos aprendizados, já que nem sempre as hipóteses e respostas encontradas pelos grupos coincidiam entre si.

A aluna Camila Leal, de 16 anos, diz que a experiência de trabalhar em um laboratório pode provocar mudanças em sua escolha de carreira. “Penso em fazer engenharia ambiental, mas ao longo do caminho pode ser que eu mude para uma área que envolva mais laboratório”, afirma.

O estudante do quarto período de Biologia Bernardo Lima assegura que o espaço de ciências despertará cada vez mais pessoas para a área. “Este projeto em homenagem ao professor Fernando diz muito sobre ele. É uma pessoa que teve muita força para ajudar a comunidade e me incentivou muito a estudar. Ele sempre me dizia Corre atrás, você tem potencial!. Vou sempre guardá-lo comigo”, conta.

A “trainee” de monitora Viviane acredita que a universidade e a pesquisa, aliadas à escola, são o futuro para quem deseja crescer. “Considero sensacional a ideia do ex-aluno voltar para a escola num período curto. O laboratório é para quem quiser usar, é de todos”, observa. “A proximidade entre escola, professor universitário e comunidade é algo que, sem dúvida, traz um grande ganho para o aluno. A iniciativa é essa: todos desenvolvendo ciência e bola pra frente!”.

Poema da Paz
Madre Teresa de Calcutá

“O dia mais belo? Hoje.
A coisa mais fácil? Errar.
O maior obstáculo? O medo.
O maior erro? O abandono.
A raiz de todos os males? O egoísmo.
A distração mais bela? O trabalho.
A pior derrota? O desânimo.
Os melhores professores? As crianças.
A primeira necessidade? Comunicar-se.
O que traz felicidade? Ser útil aos demais.
O pior defeito? O mau humor.
A pessoa mais perigosa? A mentirosa.
O pior sentimento? O rancor.
O presente mais belo? O perdão.
O mais imprescindível? O lar.
A rota mais rápida? O caminho certo.
A sensação mais agradável? A paz interior.
A maior proteção efetiva? O sorriso.
O maior remédio? O otimismo.
A maior satisfação? O dever cumprido.
A força mais potente do mundo? A fé.
As pessoas mais necessárias? Os pais.
A mais bela de todas as coisas? O amor.”

Confira o vídeo que mostra o processo de construção e a inauguração do Espaço de Ciências Prof. José Fernando Silva Mello.