Qual a melhor maneira de se conservar a alface? O que é melhor: comer macarrão instantâneo com o tempero do saquinho, ou sem? A gelatina diet é mesmo “zero açúcar”? Responder às perguntas que eles mesmos fizeram foi a tarefa dos alunos do primeiro curso de férias do Espaço de Ciências Prof. José Fernando Silva Mello, realizado entre os dias 9 e 13 de janeiro de 2012, no Colégio Estadual José Martins da Costa, em São Pedro da Serra. O laboratório foi construído e equipado com recursos da Fundação de Amparo à Pesquisa do Rio de Janeiro (Faperj), obtidos através de dois projetos pelo Membro Afiliado da ABC, Emiliano Medei, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

Com o tema “Propriedades dos Alimentos”, o curso, que contou com o apoio da pós-doutoranda do Instituto de Bioquímica Médica (IBqM/UFRJ) Patrícia dos Santos na organização, ofereceu aos alunos a oportunidade de conhecer melhor o dia a dia de um laboratório de pesquisa, bem como colocar em prática o método científico. Na primeira etapa, a turma foi apresentada ao tema e os alunos, motivados por suas próprias curiosidades, levantaram todas as questões que lhes passaram pela cabeça, as quais foram devidamente registradas em um quadro branco. “Os monitores não interferiram nesse processo. Os alunos faziam e escolhiam a pergunta que queriam solucionar. Isso aguçou ainda mais a curiosidade da turma”, explica Tuane Vieira (na foto à esquerda), monitora do curso e pós-doutoranda da UFRJ no Laboratório de Termodinâmica de Proteínas de Estruturas Virais do Instituto de Bioquímica Médica.

Divididos em grupos, escolheram então as perguntas para as quais buscariam respostas e, com o auxílio de professores da escola, monitores e pesquisadores da UFRJ, desenvolveram experimentos buscando comprovar suas hipóteses. Para a monitora Bárbara Guerra (na foto à direita), do Aperfeiçoamento Profissional do Laboratório de Eletrofisiologia Cardíaca da UFRJ, o entusiasmo foi tão grande que motivou até mesmo quem estava ali só para ajudar. “As perguntas foram tão bacanas que contagiaram os monitores. No final, todas foram respondidas e eles ainda foram além, pois uma curiosidade levava a outra e quando se davam conta já estavam surgindo novas perguntas”, relata. Entre algumas das questões levantadas, Bárbara destaca “Por que os alimentos escurecem?”, “Por que a cebola faz chorar?”, “Qual a diferença entre os ovos caipira, branco e vermelho?”, “Por que a maçã não escurece quando se passa limão nela?”, “Cozinhar feijão com prego libera mais ferro e faz bem à saúde?”, entre outras.

Segundo Tuane, o método científico começa a valer na hora que os alunos liberam a criatividade e começam a se questionar, o que os encoraja a assumir o papel de solucionadores de problemas. “Eles criam as perguntas e, logo depois, os grupos começam a formular hipóteses. A terceira etapa depende diretamente das hipóteses sugeridas, uma vez que os experimentos são os testes dessas formulações”, conta. “É um trabalho de investigação. Se a hipótese inicial não é suficiente, eles pensam em outras possibilidades, montam outros experimentos e assim por diante, até alcançarem um resultado satisfatório”.

Futuros cientistas

Ao final de todos os dias, os grupos se reuniam para um grande debate, onde apresentavam todas as atividades realizadas até então. Bernardo Lima, monitor e representante de um dos grupos, participou do experimento da alface e tentou descobrir, junto com os demais integrantes, qual a melhor maneira de conservar a hortaliça e se é possível reidratá-la após ter murchado. “Testamos três métodos. A alface hidropônica vem com raiz, logo a deixamos na água limpa. O segundo método foi lavar todas as folhas, secar e guardar a alface dentro de um saco plástico na geladeira. Por último, deixamos a hortaliça na geladeira sem nenhum invólucro”, explica. Após algum tempo, o grupo observou que a alface na água estava bem conservada, bem como a que ficou na geladeira dentro do saco plástico. “Pelo aspecto das folhas, como textura, peso e cor, o primeiro experimento e o segundo foram os que deram certo.”

Em um determinado momento, o grupo pesou a folha de uma alface em perfeito estado e uma murcha, constatando que a segunda havia perdido água e sais minerais. “A partir daí tentamos reidratá-la, colocando a folha em água destilada, que é obtida através da condensação do vapor de água originado pela água em ebulição”, ensina Bernardo. “Pesamos a folha após o experimento e vimos que ela ganhou peso, ou seja, absorveu água e sais novamente, voltando quase cem por cento ao seu estado original.”

Outro grupo escolheu a pergunta da gelatina e constatou, através de determinados indicadores, que a gelatina diet realmente não continha açúcar. Já no teste do macarrão instantâneo, a estudante Maria Juliana conta que o resultado foi surpreendente, pois o tempero do saquinho acusou uma quantidade enorme de sal e corantes. “É melhor para a saúde comer macarrão instantâneo com outros temperos e, de preferência, com menos sal”, brinca.

Alguns alunos de um determinado grupo sugeriram que a maionese, quando deixada no sol, pode criar bactérias. A monitora Bárbara Guerra afirma que os estudantes imaginaram que, pela maionese ser um produto muito industrializado, a hipótese se confirmaria. “Eles deixaram um recipiente aberto no sol e, um tempo depois, observaram no microscópio que não havia bactéria”. Outro experimento feito por um dos grupos, ressalta, foi verificar qual o melhor jeito de higienizar as mãos. “Primeiramente, todos os quatro integrantes do grupo botaram a mão em uma placa para analisar a quantidade de bactérias e poder comparar com a mão depois de limpa”. O primeiro lavou a mão com água na pia do banheiro, o segundo, com sabonete também na pia, o terceiro usou o tanque do laboratório com o detergente que era utilizado na lavagem de utensílios e o quarto higienizou com álcool gel. “Eles botaram a mão novamente na placa e, pela quantidade de bactérias, observaram que o álcool gel é a melhor solução”, diz.

Enriquecendo a educação básica

De acordo com Tuane, a iniciativa deu aos alunos uma visão de como um cientista, em seu laboratório, consegue chegar a uma determinada resposta. “Muitos alunos têm uma noção distante do que é a realidade dentro de uma universidade e como se faz ciência dentro das instituições”, aponta. Para ela, o curso foi importante, também, porque desmitificou o método científico, mostrando que ele pode ser usado no dia a dia e não somente em experimentos complexos.

Bárbara, por sua vez, conta que em uma das palestras que ministrou no colégio estadual para alunos de ensino médio, ficou surpresa, pois uma grande quantidade de estudantes não sabia que o Rio de Janeiro realizava pesquisas em universidades como a UFRJ e outros centros de excelência. “Eles visitaram os laboratórios da UFRJ e não acreditaram que no estado onde moram existem tantas pesquisas”, observa. “Acima de tudo, ver os alunos despertando para a atividade científica é incrível. Foi uma experiência que me enriqueceu, pois pude entender a realidade deles mais de perto. Além disso, foi tudo muito divertido para todos do grupo; formamos uma grande família”.

Os alunos, os professores e os monitores do curso de férias “Propriedade dos alimentos”, no Colégio Estadual José Martins da Costa, em São Pedro da Serra.