Daniella Bartholomeu, Luiz Drude, Carlos Eduardo de Rezende e Ândrea dos Santos

A Academia Brasileira de Ciências (ABC) reuniu entre os dias 30/11 e 02/12 alguns dos principais pesquisadores brasileiros para apresentarem os avanços do conhecimento nas áreas em que atuam. As apresentações ocorreram durante a sexta edição consecutiva do evento “Avanços e Perspectivas da Ciência no Brasil, América Latina e Caribe.”

A possibilidade de diagnóstico precoce do Câncer

Pesquisadores da área das Ciências Biológicas apresentaram suas pesquisas em uma mesa coordenada pelos Acadêmicos Paulo Artaxo (USP) e Luiz Drude de Lacerda (UFC). A Acadêmica Ândrea Kely Campos Ribeiro dos Santos, professora da Universidade Federal do Pará (UFPA), abriu a sessão com a pesquisa intitulada “Perfis de Expressão de miRNAs no Câncer Gástrico”.
O objetivo da pesquisa é desenvolver novas ferramentas de diagnóstico precoce do câncer através do sequenciamento genético, identificando grupos de miRNAs (Micro-RNAs) que tem perfil de expressão diferenciado. Através das diferenças de perfil de expressão é possível saber se o indivíduo está saudável, se está em processo de adoecimento ou se ele já tem câncer. “Queremos diferenciar esses grupos genéticos para poder intervir e evitar o adoecimento”, afirma a Acadêmica.
As perspectivas da pesquisa são de desenvolver ferramentas práticas que não sejam invasivas e que sirvam para identificar mudanças no padrão de expressão dos miRNAs ligados ao câncer. Dessa maneira, será possível prever a doença antes que ela se instale e/ou tratar o paciente da forma adequada, utilizando a dosagem adequada de uma determinada substância para quem tenha um determinado conjunto de genótipos”, comenta a pesquisadora.
Entre o continente e o oceano
Em seguida, Carlos Eduardo de Rezende, professor da Universidade Estadual do Norte Fluminense (UENF), apresentou o estudo “Entre o Continente e o Oceano: Uma abordagem Biogeoquímica na Bacia de Campos, Rio de Janeiro”. Durante a exposição, o professor comentou sobre a mudança do uso da terra na região da bacia do rio Paraíba do Sul, focando as alterações dos ciclos biogeoquímicos da matéria orgânica e do mercúrio. A pesquisa utiliza os dois elementos para compor uma história sobre o uso da bacia, analisando as transformações que ocorreram (e que ocorrem) ao longo do transporte da matéria orgânica e do mercúrio até a chegada ao oceano.
O mercúrio encontrado na bacia é advindo das plantações de cana de açúcar com fungicida, comuns na década de 1980. Ainda no final da mesma década, existiam muitos garimpos que migraram da região Norte para a bacia de Campos, sendo que muitos usavam também o mercúrio para amalgamar o ouro encontrado nos leitos dos rios. Além disso, recentemente, o garimpo reapareceu no rio Paraíba do Sul. Todos esses elementos contribuíram para transformações na bacia pesquisada.
Rezende, que é doutor em Ciências Biológicas/Biologia Marinha pela Faculdade Maria Thereza (Famath), afirma que a pesquisa “é uma forma de tentar relacionar as mudanças do uso da terra, ou seja, das transformações da retirada da vegetação original da bacia de Campos, e de ver a desregulação que isso pode causar no ecossistema, refletindo, obviamente, no mar”. O pesquisador tem se dedicado aos estudos principalmente da região entre o continente e oceano, pois acredita que não há como estudar o mar sem levar em conta as interferências que vêm do continente. “Na realidade o mar não é um depositório puro e simples de tudo. A chegada desse material também no oceano promove transformações que podem ser significativas”, comenta Rezende sobre alterações provocadas no mar pela matéria orgânica e pelo mercúrio.
Atualmente é possível constatar que em várias regiões do planeta há um aumento de eutrofização, fenômeno causado pelo excesso de nutrientes, e de geração de zonas mortas, ou seja, lugares onde não se tem mais vida. “Isso tudo é ocasionado exatamente por um aporte excessivo de matéria orgânica nessas regiões, quase que esterilizando grandes áreas oceânicas. Isso, ao longo da última década, tem aumentado exponencialmente”, lamentou Rezende.
No final da apresentação, o pesquisador comentou sobre as perspectivas da pesquisa que tenta atrelar os estudos dos processos oceanográficos com estudos do continente e afirmou que o Brasil carece de investimento em equipamento primário, de coleta de amostra e de embarcações para realizar pesquisas no oceano. “Essa área do oceano profundo era considerada, até recentemente, uma área monótona. Hoje já se vê que ela é uma área extremamente heterogênea e dinâmica e que representa 80% dos oceanos, requerendo, portanto, mais atenção”, concluiu Rezende.
Variabilidade de antígenos do T. Cruzy
Daniella Castanheira Bartholomeu, doutora em Bioquímica e Imunologia pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e professora titular da mesma universidade, foi a último a se apresentar, com o trabalho “Variabilidade antigênica do parasita Trypanosoma cruzi”. Durante a palestra, ela expôs seu esforço de pesquisa em tentar responder algumas questões relacionadas ao T. cruzi, causador da doença de Chagas, e de buscar fazer pesquisa aplicada para identificar novos antígenos do parasita, capazes de iniciar a produção de anticorpos, que podem ser utilizados para diagnóstico e vacinas.
Em 2005, Bartholomeu participou da conclusão da pesquisa do sequenciamento do genoma do protozoário Trypanosoma cruzi pelo “Projeto Genoma do Parasita T. cruzi“, no qual o Brasil esteve representado por oito cientistas, vinculados às universidades federais de Minas Gerais (UFMG) e São Paulo (Unifesp), à Universidade de São Paulo (USP) e ao Centro de Pesquisas René Rachou, ligado à Fundação Oswaldo Cruz. Desde então, a pesquisadora se empenha nos estudos sobre a variabilidade antigênica do parasita. “O T. cruzi apresenta uma característica muito marcante que é da variabilidade muito grande em relação aos antígenos que compõem a sua superfície. Tentamos entender como essa variabilidade traz implicações para a biologia do parasita, tanto como estratégia de sobrevivência como na dificuldade de diagnóstico”, comenta.
Em relação à pesquisa aplicada, Bartholomeu e o seu grupo de pesquisa têm conseguido com sucesso identificar novos antígenos do T. Cruzi. “Algumas cepas são mais virulentas e outras são menos, estamos tentando entender o porquê de isso acontecer”, afirma. Segundo ela, a dificuldade encontrada hoje é a de identificar qual é a cepa que está causando a infecção no paciente. “Algumas cepas são mais virulentas e outras são menos, estamos tentando entender o porquê de isso acontecer. E a ideia é tentar encontrar antígenos que sejam comuns a diferentes cepas, porque isso teria uma aplicabilidade para vacinas”, conclui.
Veja a seguir o vídeo com alguns trechos do debate sobre as Ciências Biológicas: