A edição de Salvador do Simpósio Academia-Empresa, que aconteceu no dia 6 de outubro, teve entre os palestrantes o gerente executivo da Unidade de Tecnologia Industrial da Confederação Nacional da Indústria (Unitec-CNI), Jefferson de Oliveira Gomes. O engenheiro, que também é gerente executivo de inovação do Senai-DN, discorreu sobre o tema da inovação.

A origem da inovação

Buscando um conceito nacional de inovação, Gomes questionou o significado do termo: “Como é que dá um estalo a respeito de um assunto novo? De onde vem essa ideia?” O palestrante adicionou a essa questão um comentário sobre as empresas brasileiras, afirmando que a maioria está fazendo parte do trabalho no exterior, principalmente serviços laboratoriais. “Como aqui não há tempo, espaço e existem poucos laboratórios, todo mundo está trabalhando lá fora. Mas como podemos querer inovar se o nosso dia a dia não é aqui?”.

Gomes apresentou um vídeo que mostrava a cidade inglesa de Londres no começo do século passado. “As pessoas estão como nós aqui, de terno e gravata, mas a diferença óbvia é que não há automóveis, apenas carroças. E por que os carros foram criados?” Ele explicou que, para atender a 200 mil pessoas em uma metrópole como a capital da Inglaterra na época, eram necessários muitos cavalos, em torno de 600 mil. No entanto, um cavalo saudável produz diariamente em torno de 17kg de estrume, e essa sujeira nas cidades grandes acabou gerando a peste na Europa. “A febre tifóide, por exemplo, surge basicamente a partir da mosca no estrume do cavalo”, afirmou.

Deste modo, os governos inglês e americano se uniram para pensar em utilizar tecnologias, visando resolver a situação. Assim, investiram no automóvel elétrico. “Em termos práticos, o automóvel e a combustão tradicional surgiram devido a um problema de saúde pública”, declarou Gomes. “Para mim, isso é inovação: uma aplicação do conhecimento em prol de uma melhoria para a sociedade”. O engenheiro falou sobre as corporações que atuam no sentido de promover benefícios para a população, mas que também precisam gerar royalties. “Esses royalties contribuem para o crescimento da nação, só que também geram poluição”. Gomes acrescentou, no entanto, que não existe possibilidade de o mundo estar sendo destruído por conta da poluição humana, que não chega a 10% da poluição do planeta. “Mas, se uma indústria polui, não importa se é pouco ou muito. O problema é que ela polui”.

Poluição e a indústria da aviação

De acordo com o palestrante, a fabricação de apenas um automóvel produz cerca de 70 toneladas de CO2 ou gases semelhantes, o que representa uma grande geração de poluição. Considerando que o carro ainda vai rodar 200 ou 300 mil km, ele se torna ainda mais poluidor. “Países como o nosso, cujas cidades não têm uma estrutura muito bem feita, começam a ter um problema considerável relativo à saúde humana”, comentou. “Um outro fator interessante é que o automóvel 1.0 ou 1.4, depois de ficar parado duas, três horas no trânsito com o motor ligado, gera uma vibração que causa dor de cabeça”.

Em relação à importância do desenvolvimento tecnológico, Gomes citou o exemplo dos aviões: quando uma aeronave passa por uma turbulência, um leve balanço é causado na estrutura. Considerando que esse avião está voando a 900 km/h, esse pequeno movimento sentido pelos passageiros corresponde a 40 metros de subida e descida. “Por isso, o material utilizado nessas aeronaves tem que ter uma característica elástica enorme”, afirmou.

Gomes acrescentou que, atualmente, a produção de um avião gera bastante lixo, de modo que todos os processos de fabricação são desperdiçados, sobrando apenas a usinagem. “Avião é praticamente lixo não-reciclável, só que não deixa de ser um projeto magnífico, inovador”. O engenheiro disse que um voo entre Guarulhos e Frankfurt, por exemplo, que leva por volta de 13 horas, consome aproximadamente 160 mil litros de querosene. “Mas o que vai ser usado, de fato, são 20, 25 mil litros, o resto é jogado fora”. Ele continuou: “Daqui a 50 anos, as pessoas vão rir da nossa cara assim como rimos das carroças”.

Ainda em relação à indústria da aviação, Gomes apresentou o cenário do movimento de aeronaves no Brasil, afirmando que são feitos 65 mil voos diários, com uma taxa de crescimento de 17% ao ano. “É absurda a quantidade de aviões que está sendo lançada”, declarou. “A Embraer, por exemplo, lançou um avião de três lugares que custa 3,5 milhões de reais. São 350 mil litros de combustível por ano para uma pessoa pegar seu avião no Texas e trabalhar em Los Angeles todos os dias. É um mercado que cresce, mas cresce errado; há muita inovação para ser feita”.

O cenário brasileiro

O palestrante enfatizou que o Brasil está em ótima fase e possui grande capacidade, uma vez que é dotado de matérias-primas e existe uma demanda global. “Nosso país é o celeiro do mundo e não deixará de ser”, comentou, entusiasmado. Contribuem para o cenário auspicioso o fim das restrições externas, uma elevação do grau de liberdade e o dinamismo do consumo doméstico – a partir do aumento da renda, melhoria da distribuição etc.

Segundo Gomes, a indústria brasileira está crescendo, mas existe um déficit na balança quando se trata de produtos tecnológicos. “Uma máquina de tratamentos estéticos a laser, por exemplo, custa em torno de 60 mil reais. Mas eu desmontei uma delas uma vez e descobri que ela não custaria mais de 4 mil reais para ser fabricada. O que gera o preço é o valor agregado, o efeito”, contou, enfatizando a necessidade de importar menos e produzir mais. “Nós estamos bem, mas se não tomarmos uma atitude em relação à inovação nos próximos 15 anos, vamos quebrar”. Ele explicou que, por isso, o assunto se tornou prioritário para o Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), que adotou inclusive o último termo no nome recentemente.

Gomes declarou, também, que um dos desafios da inovação é a falta de estudo: “Nós somos acostumados a trabalhar na nossa zona de conforto. Só usamos a regra de três, apesar de termos feito engenharia. Ninguém sabe fazer uma integral. Então perguntam por que a gente não sabe fazer inovação. Primeiro porque não temos laboratório, segundo porque estudamos pouco”.

Para o engenheiro, é fundamental gerar desenvolvimento pré-competitivo no Brasil, assim como é feito na Europa. Segundo ele, o Senai começou a investir na criação de 22 institutos capazes de atender essa lacuna do segmento pré-competitivo ligado à indústria. Gomes mencionou que é importante montar grupos em diversas áreas do conhecimento, como tecnologia da comunicação, microeletrônica e engenharia de superfícies. “Alguns fatores são muito importantes para o nosso setor industrial, como a integração de tecnologias e o auxílio à tomada de decisões multi-critérios”, declarou.

Sobre tais decisões multi-critérios, ele citou um exemplo: uma plantação de algodão é extremamente atacada por insetos, de forma que, para gerar um litro de algodão, é necessário um litro de agrotóxico. Porém, para produzir esta quantidade de algodão, precisa-se de 20 litros de água. Esta plantação fica em uma região com muitos mananciais, logo a chance de poluí-los é grande. Pode-se, então, usar algodão transgênico, mas, já que ele é resistente às pragas, a abelha que vai polinizar essa região não consegue mais contribuir com a biodiversidade. “Em um lado, existe o problema da poluição, em outro, o do balanço ecológico em função da modificação. Qual é a tomada de decisão? Usa-se, portanto, estatísticas matemáticas para atender a uma situação do dia a dia”, resumiu Gomes.

Ele concluiu sua palestra afirmando que, para desenvolver inovação, devem existir políticas industriais, incentivos fiscais, melhoria dos marcos regulatórios, fortalecimento da atração de investimentos, entre outros aspectos. “Um ponto essencial é uma ênfase maior na formação de recursos humanos. Isso é um problema sério, nós não temos gente qualificada suficiente”. Gomes também comentou a falta de engenheiros no país, mencionando que existem mais vagas nessa área do que em qualquer outra, mas que a taxa de formandos é muito baixa. O palestrante frisou, por fim, a importância da cooperação acadêmica e industrial: “Se a indústria não entrar também com um grande aporte de capital, não dá. Não depende só do governo”.