Em sua manifestação mais dura sobre a reforma do Código Florestal, as principais sociedades científicas brasileiras adjetivam partes do texto em análise como “injustificado” e “inconstitucional”. A Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) e a Academia Brasileira de Ciências (ABC) entregaram na semana passada a senadores propostas para embasar as mudanças na lei. Para elas, a ciência não foi levada em conta no relatório do deputado Aldo Rebelo (PC do B-SP), aprovado em maio no plenário da Câmara.
Entre as 18 assinaturas do documento há pesos-pesados como a antropóloga e Acadêmica Maria Manuela Ligeti Carneiro da Cunha, o Acadêmico Carlos Afonso Nobre, secretário de Pesquisa do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação e Tatiana Sá, ex-diretora-executiva da Embrapa. Para eles, o maior entrave à expansão da agricultura não é a legislação ambiental, mas “a falta de adequação” da política agrícola do País.
Para os cientistas, um aumento marginal na produtividade pecuária – com medidas simples, como erguer cercas e fazer o manejo de pastos – liberaria 60 milhões de hectares para a agricultura. “Continua no Senado essa falácia de que não há espaço para preservar e produzir alimentos”, disse o Acadêmico Luiz Antonio Martinelli, da USP de Piracicaba. “Como é que eu vou dizer para a Europa não subsidiar sua agricultura quando a gente queima tudo sem nenhuma eficiência? É um tiro no pé.”
As entidades também pedem que as APPs (áreas de preservação permanente), como margens de rios, sejam restauradas na íntegra, posição mais “ambientalista” que a do governo, que aceitou flexibilizar sua recomposição. Os cientistas exigem, ainda, que o Senado elimine do texto a menção à “área rural consolidada”, que permite regularizar atividades agropecuárias em APPs desmatadas até 22 de julho de 2008. Segundo eles, a Constituição diz que “não há direito adquirido na área ambiental”.
“Nosso livro anterior dava dados, mas não fazia afirmações tão contundentes”, disse Carneiro da Cunha, aludindo ao documento divulgado no semestre passado. Expoente da antropologia, a Acadêmica afirma que os senadores precisarão tratar um tema espinhoso sem acordo: a isenção de reserva legal para propriedades de até quatro módulos fiscais (medida equivalente a até 400 hectares na Amazônia). “Quatro módulos não é o mesmo que agricultura familiar. É uma pegadinha.” Ela diz esperar que o senador Luiz Henrique da Silveira (PMDB-SC), relator do código em três comissões, seja “persuadido por argumentos convincentes”.