Presidente da Academia Brasileira de Ciências, o matemático Jacob Palis defende a aproximação entre indústria e produção científica como essencial para o surgimento de grandes inovações. Palis participou hoje (6/10) do Simpósio Academia-Empresa, na Federação das Indústrias do Estado da Bahia (FIEB), quando afirmou que os cientistas devem ouvir as demandas do setor industrial com uma visão mais provocativa.
Pergunta (P) – Não obstante os avanços, o distanciamento entre academia e indústria persiste. Por que os avanços são tão demorados nesse sentido?
Resposta (R) – A ciência no Brasil é muito jovem. Ela realmente toma força a partir da Segunda Guerra Mundial, ou seja, é muito recente. A prioridade da primeira linha de cientistas foi tornar mais sólida a comunidade científica. Tivemos sucesso. Agora, está na hora de se juntar com o setor produtivo e enfrentar o desafio de agregar valor aos nossos produtos. Esse é o momento para a inovação.
P – Quais ganhos podemos esperar da melhoria no relacionamento entre universidade e empresa?
R – Os ganhos serão enormes, a partir do momento em que essa parceria se concretizar. Eu acho que é importante para o pesquisador e é importante para a indústria. Muitos desses pesquisadores não publicarão apenas trabalhos em revistas, mas também servirão à sociedade de maneira importantíssima, agregando conhecimento aos produtos nacionais. E para a indústria será fundamental porque ela cresce e se internacionaliza com produtos de grande criatividade.
P – O Brasil tem desempenho pífio em matemática em avaliações internacionais. Por que os resultados são tão ruins e os alunos aprendem tão pouco?
R – Uma das principais razões é a forma como a disciplina é ensinada nas escolas. Na sua essência, a matemática é abstrata, uma criação do intelecto humano. E se o professor não sabe ensinar bem ou não entende o que está ensinando fica muito difícil. Por isso, o ensino da disciplina exige formação de professores. Isso já está sendo feito e trará resultados muito em breve, creio que em um cenário de 10 a 15 anos. Por outro lado, o Brasil tem um grupo de pesquisadores de primeira linha. Como se explica que o País tenha um grupo de pesquisadores de renome internacional, com uma média de citações de artigos que se compara à de países avançados, e o resultado do Pisa (Programa Internacional de Avaliação de Alunos) seja um desastre? A resposta é que são coisas diferentes. Em um caso estamos tratando de uma massa imensa de alunos que não aprendem de forma adequada a disciplina nas escolas; no outro, estamos falando de um pequeno grupo que teve condições de desenvolver seu talento.
P – O pensamento abstrato é um talento ou se aprende?
R – É um talento. Quando estive no Programa do Jô ele me perguntou se eu abracei a matemática ou ela me abraçou. Eu respondi: “Ambos”. Não existe um amor unilateral. A matemática é a rainha das ciências porque é um produto do nosso intelecto. Portanto, é preciso ter talento, mas também paixão.
P – Há quem afirme que o País privilegiou a formação em ciências humanas e sociais em detrimento das exatas. O sr. concorda?
R – Os números indicam que temos que reforçar a formação de engenheiros, físicos e matemáticos. Isso não quer dizer que esteja errado ter um grande número de sociólogos, mas sim que precisa haver um equilíbrio.
P – O sr. é um pesquisador renomado, com contribuições importantes ao progresso da ciência. Que pesquisa está conduzindo?
R – Há cerca de 20 anos desenvolvo uma pesquisa, cuja ideia principal é propor que é possível fazer a previsão do futuro e medir o grau de incerteza. Uma vez que tenhamos equações matemáticas, elas podem espelhar bem o fenômeno. Minha teoria é que, com muita probabilidade, essas previsões vão levar a um número finito de objetos e os diâmetros desses objetos vão medir as incertezas. Por exemplo, podemos aplicar esse teoria na previsão de tempo, na área de saúde etc. Hoje, há métodos para recolher dados de fenômenos variados, por exemplo as doenças, e, para cada um deles, existem instrumentos científicos que resultam em uma porção de dados sobre determinado assunto, mas não se sabe o que fazer com esses dados, como extrair deles resultados. Se encontrarmos uma maneira de plotar esses dados matematicamente numa tela, eles se acumularão em um número finito de pedaços. O resto serão dados que se espalham sem muito significado. Ao focarmos nos pontos onde os dados estão agregados, conjecturo que essas concentrações revelam o futuro.