A tarde de 14/9, primeiro dia do simpósio “Ciência, Tecnologia e Inovação: Visões da Jovem Academia, contou com a participação dos Membros Afiliados na mesa Educação e Divulgação Científica. Estiveram presentes, como debatedores, o Acadêmicos Roberto Lent, professor titular da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) que atua na área da Neurociência; Adán José Corcho Fernández, professor titular de Matemática da UFRJ; Sandra Zanotto, professora titular de Química da Universidade do Estado do Amazonas (UEA); como mediador Stevens Kastrup Rehen, professor titular do Instituto de Ciências Biomédicas da UFRJ e, como relator, Krerley Irraciel Martins Oliveira, professor associado da área de Matemática da Universidade Federal de Alagoas (UFAL).
Stevens Rehen, Roberto Lent, Krerley Oliveira, Adán Fernández e Sandra Zannotto
Criatividade na divulgação científica
O Membro Titular da ABC Roberto Lent, autor de livros de divulgação científica para adultos e crianças, é membro do Conselho Técnico-Científico da CAPES/Ensino Básico e presidente do Conselho Deliberativo do Instituto Ciência Hoje, tendo sido um dos fundadores da revista. O pesquisador iniciou sua apresentação falando sobre o baixo envolvimento da comunidade científica em atividades de educação e divulgação. “Como superar? A meu ver, temos que aplicar métodos persuasivos e coercitivos”, defendeu, acrescentando que a sociedade já está se convencendo da importância de divulgar ciência mas, por outro lado, é preciso estimular os pesquisadores que não desenvolvem esse tipo de atividade. “Temos que recompensar os que fazem divulgação científica, assim como deixar de recompensar, com auxílios financeiros a projetos, por exemplo, os que não atendem às exigências”.
Outro ponto levantado pelo Acadêmico foi relativo a bolsas de produtividade para a área, consideradas por ele um fator importante, uma vez que não se tratariam das bolsas de pesquisa concedidas pelo CNPq, mas sim de bolsas que valorizariam as ações que o pesquisador promove na área. “Não estaríamos avaliando a produtividade do indivíduo da maneira como conhecemos, mas sim incentivando sua atuação como comunicador e divulgador. Essa é uma questão em aberto, pois precisamos criar uma tradição para melhor avaliar e compreender essa modalidade de bolsas”, esclareceu.
De acordo com ele, o comitê científico específico para divulgação científica ajuda os profissionais que trabalham com o tema a unificar e fortalecer as atividades desenvolvidas. Em sua opinião, a área também deveria ser incluída nos comitês técnicos já existentes, como o de química, física, morfologia, entre outros. “O grande problema é que não se estimula o comitê a discutir políticas para a área. As agências de fomento deveriam estender sua atenção para esse fato, dando auxílio e suporte.”
Ao final, Lent destacou a necessidade de definir critérios para a avaliação das atividades de divulgação científica, que, para ele, é uma tarefa trabalhosa e que requer cuidados. “Temos uma cultura de avaliação de pesquisa, mas não sabemos ao certo como avaliar essas atividades porque não temos uma cultura nessa área”, explicou. Além disso, o Acadêmico ressaltou algumas propostas como, por exemplo, a interação entre laboratórios e assessorias de jornalismo científico e o estímulo aos diferentes instrumentos que possibilitam a divulgação científica. “Por que não ousar e divulgar ciência de maneiras inusitadas? O céu é o limite quando se trata de divulgar e despertar a sociedade para a ciência”.
Ferramentas de ensino à distância podem ajudar divulgação científica no Norte do país
A segunda a se apresentar foi a Acadêmica Sandra Zanotto, Afiliada desde 2008. Zanotto coordenou o Programa de Mestrado em Biotecnologia e Recursos Naturais da Amazônia de 2009 a 2010 e o Programa Jovem Cientista Amazônia da Fapeam, desenvolvido na Terra Indígena Marajaí, no médio Solimões, com a etnia Mayoruna. Tendo se mudado do Sul/Sudeste para a região Norte em 2007, atualmente ela coordena um projeto de inclusão social da Capes chamado Qualidade de Ambientes Aquáticos de Parintins, Itacoatiara e Manacapuru (Qualipim).
A pesquisadora abordou a questão da educação na Amazônia, que, a seu ver, é um desafio que precisa ser superado. “Temos nessa região 24 milhões de habitantes, sendo 40% desse total composto por jovens de até 17 anos. Ou seja, um potencial que não está sendo aproveitado”, apontou. Segundo Zanotto, a região Norte é conhecida por suas grandes assimetrias, principalmente pelo alto nível de desigualdade social. “Ainda assim, é o local do país mais rico em diversidade, com a maior malha hidrográfica do mundo. De fato, a região amazônica precisa ser analisada separadamente, pois nenhuma outra região enfrenta a complexidade que se concentra no Norte”.
Em 2006, foi aprovada, pelo Conselho Estadual de Educação, uma proposta pedagógica no estado do Amazonas que oferece ensino médio presencial com mediação tecnológica. A iniciativa já atendeu 1500 comunidades em todos os 62 municípios. “Só no ano de 2009/2010 foram formados 14 mil alunos. Esse projeto foi implementado pela Secretaria Estadual de Educação (Seduc) do Amazonas com o objetivo de criar um Centro de Mídias de Educação do estado. Trata-se de um aprendizado à distância que surgiu da necessidade de levar o ensino médio à população que, devido à dificuldade geográfica, sequer o iniciavam, pois não conseguiam chegar às escolas”, explicou a pesquisadora.
A metodologia do projeto consiste em duas aulas diárias que são transmitidas via satélite para os alunos que se encontram na escola, assistindo em tempo real. “Os estudantes são orientados em classe por um professor tutor e, em Manaus, na Seduc, fica um professor titular dando aula em um dos quatro estúdios montados. A infraestrutura é muito interessante”, acentuou Zanotto, acrescentando que o projeto, atualmente, também atende ao ensino fundamental. “Existe interatividade, por mais que seja à distância. Os alunos não deixam de ser assistidos em nenhum momento”.
O projeto ganhou o prêmio brasileiro E-Learning Brasil nos anos de 2009, 2010 e 2011 na categoria “Referência Nacional”. Em 2009, ganhou três prêmios: o de Rede de Inclusão Digital, o prêmio espanhol Learning Impact Awards e o WISE Awards, do Qatar. “Particularmente, acredito que essa metodologia pode ser utilizada de forma a contribuir para a difusão científica”, concluiu a Acadêmica.
Pela qualificação dos professores do ensino básico
Adán Fernández, eleito Membro Afiliado em 2010, já publicou livros de divulgação para o ensino básico e coordenou, em Alagoas, treinamentos para as Olimpíadas de Matemática e Iniciação Científica Júnior. Fernández falou da sua experiência na área da educação científica, que, segundo ele, vive um momento bom. “A área da matemática, por exemplo, tem sido bastante estimulada. A Capes tem dado muito apoio e incentivo à criação de mais programas de pós-graduação”, ressaltou. Contudo, o pesquisador voltou sua preocupação para o ensino básico e médio. “Antes de pensarmos em consolidar a educação no mestrado, doutorado e pós-doutorado, precisamos nos preocupar com os alunos que chegarão a esses níveis, ou seja, focar na qualidade da base educacional que esses estudantes estão recebendo”.
De acordo com ele, os primeiros anos de ensino não contam com um nível profissional adequado. O pesquisador citou, como exemplo, o Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM), que, na maioria dos estados, não obtém um resultado satisfatório. “Vejo pela dificuldade que meus alunos têm com problemas matemáticos, sem contar com as outras disciplinas”. Em sua experiência com a Iniciação Científica Júnior, Fernández destacou casos nos quais os docentes ocupam seu tempo no final de semana para conseguir orientar os alunos adequadamente. “Se por um lado estamos nos preocupando com o ensino, estamos deixando nossas pesquisas de lado. A grande questão é que, muitas e muitas vezes, eu destino meu tempo explicando aos alunos coisas que eles já deveriam saber”, acentuou.
O matemático afirmou que a educação básica requer professores bem capacitados, com mestrado e doutorado pois, para ele, essa iniciativa estimularia o crescimento profissional do aluno desde os primeiros anos de escola. “Sobre o fato do estudante não saber o que vai fazer no vestibular ou, além disso, escolher a profissão por eliminação, como se ele não tivesse escolha, levanto a questão: em que tipo de profissional essa pessoa irá se transformar? Esses alunos chegam às universidades perdidos. Precisamos fazer mais por eles”.
Educação em ciência para todos
Ao final, Krerley Oliveira apresentou o relatório com as propostas levantadas durante o debate. Foi acordado que a comunidade como um todo precisa de maior envolvimento com atividades de educação e divulgação científica. “Podemos conseguir isso através de bolsas de produtividade e exigindo maior peso pelos comitês de avaliação para as ações que venhamos a desenvolver nesse âmbito”, comentou Oliveira.
Os presentes apoiaram, também, o fomento a iniciativas de treinamento para divulgação científica, com participação multidisciplinar dos agentes envolvidos, como jornalistas, pesquisadores e alunos. “Dentro desse fomento, podemos incluir também o estímulo às olimpíadas das áreas de exatas e ciências. Aumentar a divulgação, para que cada vez mais alunos se interessem, e expandir as áreas que aplicam essas provas”, relatou o Membro Afiliado.
Para o pesquisador, é igualmente fundamental a valorização dos profissionais, com salários compatíveis e infra-estrutura adequada. “Entende-se que a educação em ciência é importante para ultrapassar as barreiras de desenvolvimento e formar cidadãos que pensem o progresso do país”. Para fortalecer ainda mais a área, os Acadêmicos propuseram a criação de secretarias estaduais, que trabalhariam em conjunto com as agências de fomento. “Elas reuniriam esforços para cada estado, ajudando as escolas de uma determinada localidade, assim como divulgariam ciência para crianças, jovens, adultos e idosos de todas as classes”, finalizou.
Assita ao vídeo com o relatório da Mesa Educação e Divulgação Científica.