Curiosidade, persistência, inteligência, autonomia, responsabilidade, senso de ética, obsessividade. Para Tatiana Roman, essas são as principais características necessárias a um cientista.

A um jovem que pensa em seguir pela área da Ciência, ela diria primeiro para estudar, ler a respeito das diferentes áreas para ver qual o assunto que lhe interessa mais. Depois, diria para procurar conhecer as diferentes atividades que podem ser exercidas dentro da área escolhida, para ver se encaixam com seu perfil, sua personalidade e expectativas de vida profissional.

Por fim, diria para experimentar. “Na dúvida, experimente. Se não gostar, passe para outra. Uma dica: a carreira científica não é muito fácil, mas colher os frutos é muito prazeroso!”

Os primeiros passos

Nascida em Veranópolis, no interior do Rio Grande do Sul, no ano de 1973, Tatiana Roman teve uma infância divertida. Era a caçula, com apenas uma irmã, nove anos mais velha. Brincava com amigos, com os primos e conta que podiam brincar na rua sem medo nem preocupação com a segurança – vantagens de cidade do interior. “No verão tinha piscina e no inverno tinha neve. Era ótimo quando a mãe nos acordava pra ver a neve no meio da noite…”, recorda.

Seu pai era bancário e a mãe cuidava da casa e das filhas. Tatiana brincava de ser professora com suas bonecas e com as crianças menores, escrevendo no quadro-negro as lições do ano anterior. Tinha um casal de tios que adorava e se recorda de acordá-los de manhã bem cedo, quando vinham de Porto Alegre, para que lessem histórias para ela. Lembra que sempre foi ligada aos livros: estava sempre lendo ou inventando coisas com as enciclopédias. Não era chegada aos esportes, mas gostava de dançar: balé clássico, jazz e sapateado passaram por sua agenda.

Durante os primeiros anos de escola, Tatiana não tinha matéria preferida, gostava de tudo. Mas se lembra de ter tido grande interesse num kit-laboratório que ganhou como brinde, junto com uma enciclopédia. “A partir daí comecei a dizer que queria ser bioquímica, fazer experiências, trabalhar em laboratório”, rememora Tatiana.

No ensino médio, o gosto por História e Ciências ficou mais evidente, com destaque para a Química. Gostava muito de Literatura também. A Biologia veio depois – quando estudou Genética, no 3º ano. Simplesmente adorou. E quando procurou ajuda para escolher a faculdade, o teste vocacional apontou as Ciências Biológicas em primeiro lugar. Decidiu se envolver em pesquisa a partir do 3º ano de faculdade, por influência de amigos que já estavam na iniciação científica. Começou na Histologia e depois foi para a Genética, já visando o trabalho de conclusão de curso.

Percurso acadêmico e influências

Ela cursou a graduação em Ciências Biológicas pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Nesse período, uma referência forte foi a professora que dava Zoologia de Artrópodos, Paula Beatriz de Araujo. “Adorei a disciplina, o conteúdo e a maneira como ela dava aula. Várias coisas que faço hoje como professora vem dela. Neste sentido, ela foi com certeza meu grande modelo”.

Outra influência marcante foi seu orientador do bacharelado, Claiton H. D. Bau. “Aprendi muito com ele naquela época. Depois, trabalhamos juntos no mestrado e viramos colegas e amigos ao longo do meu doutorado. Graças a ele ganhei meu primeiro edital de pesquisa”, conta Tatiana.

Logo que se graduou, cursou o mestrado e o doutorado em Genética e Biologia Molecular na mesma universidade, onde atualmente é professora adjunta do Departamento de Genética. Logo depois fez um estágio de pós-doutorado Trinity College Dublin, na Irlanda, para análises laboratoriais vinculadas a um projeto colaborativo, financiado pela rede internacional de pesquisadores Attention-Deficit/Hyperactivity Disorder Molecular Genetics Network. Sua orientadora do mestrado e do doutorado, Mara Helena Hutz, também foi uma influência marcante em seu percurso profissional. “Ela me ensinou como estruturar e conduzir um projeto, como organizar e manter um laboratório, como lidar com o dinheiro dos editais e outras coisas desse tipo. É uma pessoa muito inteligente, antecipa as coisas, percebe as coisas antes e dá a largada… Até hoje, as dicas dela são quentes…”

Tatiana registra também a importância em sua formação e carreira do co-orientador de doutorado, Luis Augusto Rohde. “Foi através dele, dos seus contatos e esforços que comecei a viajar para outros estados e países, ir aos mais diferentes eventos. E é graças a isso que hoje conheço pessoalmente e sou reconhecida por vários pesquisadores importantes da área.”

A área de pesquisa

Sua opção por uma área ainda pouco estudada no Brasil – a Genética do Comportamento, mais especificamente a Genética Psiquiátrica – aproximou-a das pessoas certas nos momentos certos, em seu ponto de vista. “E permitiu a criação de um grupo forte de pesquisa aqui no Sul, do qual faço parte até hoje, que deu muita visibilidade a todos os envolvidos”, observa Tatiana.

Seu trabalho consiste em procurar genes que possam influenciar o aparecimento de doenças mentais ou psiquiátricas ou que estejam relacionados ao comportamento humano de modo geral. Ela explica que o comportamento normal das pessoas, assim como as doenças, é determinado tanto por genes como por fatores ambientais. “Os genes dão uma predisposição, ou seja, já nascemos com um perfil genético mais ou menos propenso a apresentar tal comportamento ou tal doença”, destaca a pesquisadora, acrescentando que sobre esse perfil agem os fatores ambientais, que tanto podem modificar um comportamento, como serem decisivos para o aparecimento de uma doença.

“Conhecendo os genes poderemos entender melhor a base biológica dos comportamentos e das doenças, entender melhor como eles acontecem ou aparecem. E conhecendo-os melhor, podemos lidar melhor com eles, quem sabe até controlá-los melhor.” Tatiana considera que esse conhecimento genético pode ajudar o médico a entender melhor o seu paciente e, assim, a lidar melhor com ele, tanto na questão do tratamento como na prevenção de um quadro mais grave. “Através da compreensão da Genética podemos também entender melhor o ambiente que influencia aquele comportamento ou doença que, por sua vez, pode ser modificado para ajudar o paciente”, esclarece a pesquisadora.

Porque ser cientista?

A possibilidade de descobrir coisas novas e de contribuir para o avanço do conhecimento é o que fascina Tatiana Roman no seu dia-a-dia como pesquisadora, mesmo que isso signifique fazer novas perguntas a cada resposta. Especificamente com relação à Genética Psiquiátrica, ela acha muito estimulante entender que determinado comportamento de um indivíduo pode ser modificado pela falta ou excesso de uma determinada molécula no organismo.

“Na Ciência de modo geral, o que me encanta é exatamente a infinitude, o fato de saber que sempre terei algo para buscar, procurar, estudar. Sei que meu trabalho nunca vai perder o sentido e acho isso maravilhoso”, observa a cientista.

Ela ficou muito feliz pelo título de Membro Afiliado da ABC, pelo reconhecimento ao seu trabalho e à sua dedicação. Mas percebe que, também, significa muita responsabilidade: “Tenho que honrar este título e as pessoas que me escolheram, trabalhando muito e produzindo cada vez mais, contribuir para a produção científica do Brasil. “Nesse sentido, o título é certamente um estímulo: cada vez que penso nele, penso em trabalhar”.

A ideia de conviver com grandes cientistas de todo o país, ainda que por pouco tempo, também significa muito para ela. Acredita que fará diferença em seu currículo, talvez auxiliando na obtenção de recursos para as pesquisas. “E receber elogios e parabéns de todos também é muito bom”, diverte-se Tatiana.

Com relação a questões de gênero, Tatiana diz que nunca se sentiu discriminada no meio científico por ser mulher. “É possível que já tenha acontecido de não receber tanto crédito, mas acho que seria mais por eu ainda não ser senior investigator. Além disso, acho que é as mulheres lidam melhor com o fato de ter de fazer muitas coisas ao mesmo tempo, o que acaba facilitando as coisas pra nós”, conclui, otimista.