A ciência brasileira acordou de luto. Na manhã de 12 de janeiro de 2011 o professor Jayme Tiomno fechou um ciclo. Ciclo que como pesquisador, segundo discurso proferido em 1957 ao receber o prêmio Moinho Santista, conhecia muito bem. Em suas palavras, “o conhecimento científico e o treino adquirido na pesquisa levam ao aperfeiçoamento de tecnologia que gera novas indústrias as quais levam ao desenvolvimento econômico que, por sua vez favorece o progresso da ciência e tecnologia, fechando o ciclo”. Neste sentido, o prof. Jayme Tiomno, assim como outros notáveis de sua geração que como ele conheciam muito bem o ciclo que trilhavam, permanecera para sempre no panteão da pesquisa cientifica nacional.

Ao abrirmos o site da Academia Brasileira de Ciências, no item campos de pesquisas de Jayme Tiomno, tem-se: “Captura e desintegração de mésons – Reações entre hádrons – Fundamentos da relatividade – Universo em rotação – Teoria de campos”, ou seja, todas as interações fundamentais conhecidas.

Um de seus trabalhos, realizado nas vésperas de seus 30 anos, sobre o estudo do decaimento e captura do múon (naquela época chamado méson-mi) em colaboração com o Professor John A.Wheeler, onde propõem uma interação do tipo Fermi para as interações fracas, teoria também conhecida como Triângulo de Puppi-Tiomno-Wheeler. O própio Wheeler, em sua recente autobiografia, diz: “A equivalência entre o múon e o elétron pôde ser ilustrada pelo diagrama triangular sugerido pelo Tiomno, o qual nós usamos em um de nossos trabalhos… Este triângulo é apenas uma forma compacta de expressar a matemática subentendida, com a mesma interação atuando em todas as direções. Nós achamos o triângulo uma representação muito bonita de um padrão da natureza….Eu sempre achei que este triângulo deveria ser chamado de Triângulo Tiomno. Ele chegou lá primeiro.”

Uma parte importante do tempo de Jayme Tiomno foi consagrado aos problemas da educação, tanto superior como no ensino médio, como pode ser visto em seu pronunciamento, em 1963, na Conferência Internacional sobre Física e Educação, no Rio de Janeiro, publicada em “Why Teach Physics?”, S. Brown, N. Clark e J. Tiomno.

Em relação ao ensino universitário, Tiomno lutou para levar a pesquisa científica para as universidades. O seu ponto de vista evidenciou-se em uma série de pronunciamentos, como na aula inaugural da Faculdade de Filosofia Ciências e Letras da Universidade de São Paulo em 1968, publicada no mesmo ano com o título Ciência, Universidade e Desenvolvimento, em Ciência e Sociedade, da SBPC; também na aula inaugural da Universidade do Pará, em 1986, sob o título Experiências de uma vida na Universidade Brasileira, publicada em Ciência e Sociedade, do CBPF (1986). Em todos esses pronunciamentos, existe uma idéia comum, apoiada em três pólos: ciência, universidade e desenvolvimento, cuja interação determina um equilíbrio dinâmico, que poderíamos chamar de um outro triângulo Tiomno, enfatizando a natureza sócioeconômica da ciência. Foi certamente, esta convicção que o guiou, na decisão de coordenar o Instituto de Física da Universidade de Brasília, UnB, no projeto que chamou de “Universidade do Desenvolvimento”.

Em 1965, Elisa Frota-Pessôa e Jayme Tiomno juntamente com seus alunos do curso de Física da Faculdade nacional de Filosofia (FNFi), transferiram-se para a Universidade de Brasília (UnB) , onde já se encontrava o Prof. Roberto Salmeron, como coordenador do Instituto Central de Ciências. No projeto inicial da UnB, onde se destacava a colaboração do Prof. Anísio Teixeira, se acresciam à formação acadêmica os institutos de pesquisas, nos moldes dos campi universitários americanos, visando complementar o conhecimento das limitações brasileiras com a capacidade técnica e científica para superá-las.

O sonho durou pouco, mas foi intenso. O curso de Física iniciou completo, do primeiro ao quarto ano. Com a crise e demissão em massa dos professores a “Universidade do Desenvolvimento” transformou-se na “Universidade Interrompida”, título de um recente livro do Professor Roberto Salmeron.

Em janeiro de 1968, Tiomno foi ocupar a cátedra que ganhou por concurso na Universidade de São Paulo (USP), com novos projetos para a melhoria do ensino e da pesquisa. Todavia, com o Ato Institucional no 5 (AI-5), Tiomno, juntamente com sua esposa Elisa Frota-Pessôa, foi atingido pela aposentadoria compulsória decretada pelo governo militar. Afastado das atividades de Professor da USP, em abril de 1969, retornou ao Rio de Janeiro.

Naquela época, Tiomno se perguntava se as razões que levaram à sua aposentadoria, não estariam relacionadas à sua contribuição para o desenvolvimento da Física, como professor da FNFi, como fundador e professor titular do Centro Brasileiro de pesquisas Físcas (CBPF), como professor titular e coordenador do Instituto de Fisica da UnB, ou como professor catédratico por concurso do Departamento de Física da FFCL da USP.

Em outubro de 1969 Tiomno foi demitido do CBPF, com base no Ato Complementar 75, juntamente com Elisa Frota-Pessôa e José Leite Lopes. Passou então a trabalhar em sua residência, no Rio de Janeiro, onde sua porta continuava aberta aos seus alunos e colaboradores. Voltou a Princeton e em um ano publicou 12 trabalhos. Em seu retorno, foi acolhido pela PUC-RJ, onde se juntou a alguns de seus antigos colaboradores. Com a anistia, em 1980, foi reincorporado ao Centro que havia criado, o CBPF, e com a disposição que lhe é peculiar, iniciou a recuperação da instituição, passando a liderar um grande grupo. Nesta ocasião criou o Departamento de Relatividade e Partículas e coordenou um projeto experimental de Física de Partículas em colaboração com o Fermilab.

Ao completar 70 anos, com mais de 50 ex-alunos de doutorado espalhados pelo Brasil, desempenhando um papel decisivo para o desenvolvimento do País, Tiomno entrou na aposentadoria compulsória e como Professor Emérito do CBPF, continuou em colaboração com vários pesquisadores.