A ABC recebeu em 17/11 cientistas brasileiros e alemães para o segundo dia de encontro no Rio de Janeiro do evento científico do Ano Brasil-Alemanha de Ciência, Tecnologia e Inovação, num Simpósio sobre Materiais Avançados coordenado pelo Acadêmico Walter Mannheimer e pelo Dr. Eduard Arzt.

Nanomateriais e catálises

Abrindo o dia, os Acadêmicos Martin Schmal, professor emérito da Universidade Federal do Rio de Janeiro, e Roberto Fernando de Souza, engenheiro químico e professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, fizeram um panorama dos grupos de pesquisa brasileiros. Schmal falou sobre os nanomateriais, ressaltando a importância da área que recentemente foi reconhecida com dois prêmios Nobel, e Roberto de Souza falou sobre grupos de estudo em catálises. Os cientistas destacaram o crescimento brasileiro no setor, principalmente nos últimos cinco anos. Ao comentar os intercâmbios com a Alemanha, o professor Schmal disse que já existem alguns convênios, mas salientou que poderiam existir muitos outros.

Após mapear as 72 instituições que pesquisam nanotecnologia na Alemanha, Eduard Artz – atual diretor científico do Instituto Leibniz de Novos Materiais (INM-Saarbrücken) -, explicou as mudanças feitas por ele no funcionamento do INM durante sua gestão. “Nós acabamos com a hierarquia, agora são vários grupos de pesquisa independente, mas com uma estratégia comum”, diz ele, esclarecendo que a visão da instituição sempre foi de unir as pesquisas fundamentais e suas aplicações.

Como exemplo de pesquisas em nanotecnologia, ele citou o desenvolvimento de estruturas transparentes resistentes a arranhões, superfícies auto-limpantes e a pesquisa do grupo dele sobre superfícies biomiméticas, que atualmente tenta sintetizar em laboratório a superfície aderente das lagartixas e, futuramente, utilizá-la como cola para implantes e cirurgias. Para pesquisas posteriores, ele prevê que o INM produzirá vidros que só os pássaros podem ver e outros materiais que facilitarão nossa vida.


José Varela, Michael Hoffmann, Martin Schmal, Walter Mannheimer,
Eduard Artz, Roberto Souza, Edgar Zanotto e Joachim Deubener

Cerâmica e Vidro

O Acadêmico Edgar Dutra Zanotto, engenheiro de materiais da Universidade Federal de São Carlos, e o químico alemão Joachim Deubener, do Instituto de Materiais Não-Metálicos da Universidade Tecnológica de Clausthal (TU Clausthal), descreveram o panorama das pesquisas sobre o vidro no Brasil e na Alemanha, respectivamente. Já o físico José Varela, membro da Academia Internacional de Cerâmica e professor titular da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (Unesp), e o matemático Michael Hoffmann, da Instituto de Tecnologia de Karlsruhe (KIT Karlsruhe) falaram um pouco sobre o campo da cerâmica nos dois países.

Zanotto mapeou os grupos de pesquisa sobre o vidro no Brasil – cerca de 40 – e mostrou que, como acontece em outras áreas, esses grupos estão concentrados nas regiões Sul e Sudeste, embora existam alguns no Nordeste. Ainda assim, o Acadêmico afirmou que esses números são animadores, lembrando que no início dos anos 80 não havia sequer um grupo de pesquisa sobre o assunto e, atualmente, o Brasil conta com uma participação expressiva na produção mundial de artigos científicos sobre vidro, sendo responsável por cerca de 6% dos artigos publicados por ano. O Brasil ocupa posição similar a países como Itália, Índia, França, Japão e Alemanha no ranking.

Deubener começou sua apresentação lembrando a importância do vidro atualmente: “Se alguém for a Berlim, a primeira coisa que vai ver é vidro. Nossa Estação Central é toda de vidro”. Mas o vidro está presente em muito outros lugares além da arquitetura, apesar de não percebermos, apontou o pesquisador. Uma das principais indústrias alemãs, a automobilística, é um dos principais focos das pesquisas em vidro. “No nosso laboratório, tentamos desenvolver vidros mais resistentes para criar carros mais seguros”, exemplifica Deubener, que lamentou o fato da indústria alemã ser muito imediatista e não investir em projetos que não dêem lucro em um prazo de três anos. Outra linha de pesquisa citada por Deubener refere-se ao uso de energias renováveis para a produção de vidro. “O processo de fabricação do vidro gasta muita energia. É importante nesse momento estudarmos alternativas para a elaboração de um vidro mais sustentável”.

Na conclusão de ambas as falas, Zanotto e Deubener lembraram as cooperações já existentes entre Brasil e Alemanha no campo de vidro, mas ressaltaram que é importante aumentar cada vez mais as colaborações entre os dois países.

Nas palestras sobre a cerâmica, suas duas principais características foram ressaltadas – a alta resistência ao calor e a compressão. Michael Hoffman apontou a indústria automobilística como principal ambiente de pesquisa e destacou a Bosch como grande parceira. Ele explicou que um dos usos da cerâmica é na construção de motores mais potentes, que não “ferveriam” facilmente, e também de bombas de combustível melhores, que agüentariam pressões mais altas. Observou que a cerâmica pode ajudar a criar acessórios atraentes nos carros de luxo, como bancos aquecidos que permitam dirigir um carro conversível mesmo em temperaturas mais baixas.

José Varela contou um pouco sobre as pesquisas de seu grupo sobre filmes finos cerâmicos, um campo interdisciplinar em pleno desenvolvimento no mundo todo. A crescente necessidade de miniaturização de dispositivos de alta tecnologia levou à ampliação deste campo de estudos nos últimos 20 anos. As vantagens do uso desse material são muitas, como “menor tamanho, menor peso, fácil integração à tecnologia do circuito, baixa voltagem de operação, alta velocidade e possibilidade de fabricação de estruturas em nível microscópico”, listou Varela. Embora a maior parte das aplicações de filmes finos cerâmicos serem em microeletrônica, eles também são utilizados nas áreas de telecomunicações, dispositivos ópticos, revestimentos de todos os tipos e geração de energia.

Evolução na caracterização de nanomateriais

O físico e Acadêmico Ado Jório de Vasconcelos, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), expôs seus trabalhos recentes em propriedades físicas de nanomaterias, com foco na espectroscopia Raman e nos nanotubos de carbono.

“A espectroscopia aprimora a determinação da estrutura atômica nas pontas dos nanotubos, melhora sua visualização e análise”, explicou Jorio, que cursou dois anos de pós-doutorado do Instituto de Tecnologia de Massachussets (MIT, na sigla em inglês). Observou ainda que a despeito do crescimento vertiginoso das publicações sobre nanotubos, o número de patentes está aquém do esperado.


Walter Mannheimer, Carlos Achete, Ado Jório, Horst Niehus e Valtencir Zucolotto

Em seguida, o engenheiro Carlos Achete, chefe da Divisão de Metrologia dos Materiais do Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial (Inmetro), deu início à sua apresentação salientando a importância da colaboração entre os dois países. Achete concluiu seu PhD em Munique e mantém vínculo com diferentes professores em diversas cidades na Alemanha.

O Instituto, segundo ele, tem aumentado a cooperação tanto com universidades brasileiras quanto com estrangeiras. Afirma, ainda, que esse é um fato de extrema importância, uma vez que possibilita a renovação e disseminação do conhecimento e permite que os estudantes usufruam da estrutura da instituição.

Achete destacou a excelência da infraestrutura do campus de Xerém, no Rio de Janeiro, e observou que o Inmetro está presente em todos os estados brasileiros, o que garante a existência de uma rede eficiente.

O pesquisador considera que os desafios no campo da nanometrologia são a padronização, caracterização e definição internacional dos diferentes tipos de nanotubos. Para eliminar as barreiras de exportação e importação, é necessária a colaboração entre os países. Sua meta é que nindustrias brasileiras também possam vender instrumentos de alto valor agregado à Alemanha, no lugar de matéria prima.

O físico Horst Niehus, da Universidade Humboldt, em Berlim, encerrou o Simpósio falando das experiências de encontros científicos entre os dois países, que, segundo ele, são fundamentais para estabelecer e aprofundar contatos institucionais e pessoais. Ele recordou o workshop Brasil-Alemanha, realizado em Mangaratiba em 1995, que deu origem a uma série de outros eventos do mesmo gênero e iniciou uma colaboração definitiva.