Amazonense, 31 anos, João Vicente Braga de Souza é filho de um farmacêutico e de uma enfermeira, que também trabalhavam como professores. Vendo suas irmãs aplicadas nos estudos, João sentia-se oprimido pela própria displicência. “Eu era o vagabundo da família”, confessa com humor, “mas quando cheguei ao primeiro ano do ensino médio eu entendi o sacrifício dos meus pais e então comecei a me esforçar”.

A atuação dos pais na área da Saúde e a recente dedicação aos estudos ajudaram João a identificar sua vocação para a Biologia. Ele se interessava pela ciência básica na qual via os pais envolvidos, como as áreas de Citologia, Histologia e Bioquímica. “Eu ficava fascinado”, recorda, “Biologia era a única matéria em que eu me dava bem no colégio”.

No momento do vestibular, hesitou entre a Biologia e a Farmácia. Foi então pedir conselhos ao pai: “faz Biologia, porque pra Farmácia você não passa, ele me disse. Aí eu fiz Farmácia”.

Entrando no curso de Farmácia na Universidade do Amazonas, conheceu a professora Maria Rosa Lozzano Borras, que o encaminhou para um grupo de formação de professores chamado PET Farmácia (Programa Especial de Treinamento). “Ela mudou minha vida”, garante João Souza. Rosa foi quem lhe explicou como eram os cursos de pós-graduação e com ela Souza conviveu diariamente, pois o orientou em suas pesquisas. E então ele descobriu que sua vocação era outra: “eu não tinha vocação para Biologia, eu tinha vocação para pesquisa”.

Sua iniciação científica começou no PET, mas o programa não era tão voltado para a pesquisa quanto ele gostaria. Começou então a pesquisar com a professora Maria Francisca Simas Teixeira. “Eu fiquei três anos na iniciação científica com a mesma orientadora, mas trabalhando com três coisas diferentes: produção de enzima, produção de ração animal e produção de antimicrobianos”, complementa. Graduou-se no ano de 2000 com louvor – foi o melhor aluno do curso, orgulha-se, “e não tinha contado para meus pais”.

Em 2001, ingressou no mestrado da Universidade de São Paulo (USP-Lorena), a conselho da professora Rosa. Com os recursos da bolsa da CAPES, garantiu um teto em um albergue, dividindo o quarto com um caminhoneiro. “Meus pais tiveram três filhos e ainda ajudavam muita gente. Eu tinha que dar meu jeito”, explicou. No Laboratório de Biorreatores e Ambiente, começou a tratar resíduos com fungos, área em que ainda desenvolve suas pesquisas. Depois, obteve uma bolsa da Fapesp. No mestrado, conheceu sua atual mulher, com a qual desenvolveu suas pesquisas. Com o resultado desses estudos conseguiu uma bolsa de doutorado da Fapesp. “E em dois anos terminei meu doutorado, aos 25 anos, quando também fui pai”.

Souza então retornou às suas origens. “Comecei a trabalhar na Universidade do Norte, em Manaus, e logo fui convidado para ser coordenador do curso de Farmácia”, conta. Não que achasse que tinha vocação administrativa, mas agora ele tinha um filho agora para criar. No ano seguinte, em 2005, passou em concurso para a Fundação de Medicina Tropical do Amazonas, onde começou a pesquisar substâncias que inibissem os fungos, desenvolvendo antibióticos e metodologias para identificar os causadores de fungemia, pesquisa que lhe deu destaque. Em 2008, fez concurso para o Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA), onde começou a trabalhar em 2009 e chegou à Coordenação de Pesquisa e Saúde, com o objetivo de cuidar da coleção de microorganismos da instituição.

Atualmente, Souza segue trabalhando na Fundação de Medicina Tropical e orienta alunos de mestrado e de iniciação científica no INPA. “É como se fossemos catalisadores: precisamos formar doutores que formarão mestres que formarão professores, e estes professores têm que estar qualificados para ensinar Ciência à população”, afirma. “Nosso maior problema no Amazonas é a educação.”

Outro objetivo dos trabalhos de Souza no INPA é a utilização de novas substâncias a partir da análise de fungos. Mas esse estudo ainda está em seus primórdios. “Ainda nem estamos na fase analítica de identificar essas substâncias, estamos ainda buscando encontrar fungos interessantes que produzam substâncias aplicáveis na Medicina ou na indústria”, esclareceu. O pesquisador explicou que esse estudo inclui o trabalho de campo. “Vamos para o meio do mato, mas para lugares específicos”, explicou Souza. “Se eu quero um fungo que decomponha madeira eu vou para um lugar que tenha madeira; se quero um que descontamine rios, vou ao rio e tento isola-lo. Mas isso é só o começo. Depois levamos o fungo ao laboratório – e essa é a melhor parte pra mim”.

O que encanta João Souza é o metabolismo dos fungos, a maneira pela qual eles conseguem produzir substâncias tão particulares. A manipulação também o atrai: “gosto de observar como se pode mexer neles para que produzam as substâncias desejadas”. Souza traça um perfil do jovem que tem talento para as Ciências: “são pessoas introspectivas, que têm imaginação e curiosidade”, avalia. Ele atribui à desinformação o pouco interesse dos jovens pela Ciência. “Precisamos de novas maneiras de apresentar ao estudante as profissões nas áreas da Ciência, motivá-los, fazer com que haja um entendimento.”

João Vicente Braga de Souza agradeceu a indicação para Membro Afiliado da Academia Brasileira de Ciências e orgulha-se de pertencer ao seleto grupo de cientistas. Os pais, que desta vez souberam da façanha, também se orgulharam do filho. “Sem dúvida é uma injeção de ânimo. Mas é também uma responsabilidade.”