Segunda filha de sete irmãos, Noemia Kazue Ishikawa estudou no sítio onde vivia, em Londrina, no Paraná, até a 4a série do ensino fundamental. A partir da 5a série, eram 30 km de estrada todos os dias para estudar na cidade. Mas seus pais não mediram esforços para que todos os filhos se formassem.

Em sua infância no sítio, de tempos em tempos o pai trazia da cidade ampolas de vacinas para o gado e para as galinhas poedeiras. A vacina vinha em caixas de isopor com gelo e ficava na geladeira de casa até o dia da vacinação, um acontecimento no sítio. “Todos ajudavam, inclusive os vizinhos. E eu ficava curiosa em saber o que tinha de tão especial naquelas gotinhas aplicadas nos animais que os salvavam de doenças”, conta Noemia. E sempre que perguntava a algum adulto, eles sempre respondiam que não sabiam exatamente, mas que as vacinas eram feitas em laboratórios, por cientistas. “Desde esse tempo, então, a ciência já me encantava”, relembra a pesquisadora.

A influência para os estudos de cogumelos ela acha que veio do avô, que dedicou seus últimos 20 anos ao cultivo do shiitake. “Ele dizia que se eu estudasse bastante e com seriedade os cogumelos, um dia eu poderia me tornar uma Doutora”, lembra a neta, contando que essas palavras foram a maior motivação para que ela seguisse a carreira que seguiu.

Desde o início da graduação em Biologia, na Universidade Estadual de Londrina (UEL), Noemia participou de programas de iniciação científica. Nesta época, estudava o cultivo de cogumelo shiitake em diferentes madeiras. Certo dia houve uma grande contaminação das culturas de shiitake e os estudantes observaram um halo de inibição em torno da colônia do fungo. “Imediatamente, me ocorreu a semelhança com o episódio da descoberta da penicilina por Alexander Fleming, o que me levou aos estudos dos compostos antimicrobianos”, conta a professora.

No mestrado em Microbiologia Agrícola na Universidade Federal de Viçosa , ela verificou a ação antimicrobiana dos compostos produzidos pelo shiitake em microrganismos patogênicos. Mas foi durante o Doutorado em Recursos Naturais na Universidade de Hokkaido, no Japão, o momento em que a imagem de cientista idealizada na infância por Noemia se materializou. “Após muitos experimentos, entre tantas vidrarias, reações químicas e idéias frustradas , enfim descobri quatro compostos antimicrobianos inéditos para a ciência, que chamei de Enokipodins A, B, C e D”, arrematou a pesquisadora.

O tema principal de sua pesquisa são os cogumelos, que estuda por três ângulos. Primeiro, a diversidade de cogumelos na Amazônia. “Existem muitas espécies nessa região ainda desconhecidas para a ciência e é muito importante estudá-los, pois além do papel importante que têm para a manutenção da floresta, muitas espécies são comestíveis;”, esclarece. Esse é exatamente o segundo aspecto que ela aborda em suas pesquisas: a fungicultura, que é o estudo do cultivo de cogumelos comestíveis. “Estamos pesquisando o cultivo de duas espécies que foram encontradas no Estado do Amazonas pela primeira vez”, conta Noemia. Seu terceiro foco é a busca de novos compostos antimicrobianos. “Os passos para uma vacina ou um medicamento chegar às prateleiras são praticamente inumeráveis, mas tudo começa com a sua descoberta, por isso este tem sido um dos meus temas favoritos”, observa.

Quando soube da indicação para Membro Afiliado da ABC para o período de 21010 a 2014, feita pelo Acadêmico Tetsuo Yamane, Noemia achou que foi indicada porque estava no lugar certo, na hora certa, fazendo algo diferente dos demais. Hoje, encara a indicação como algo de muita responsabilidade, “pela evidência em que nos coloca e pelo reconhecimento do trabalho que tenho realizado até aqui”, diz.

Ela agradece a todos os que permitiram ou colaboraram para que ela pudesse desenvolver seu trabalho com liberdade. Para a bióloga, o ponto de chegada dos sonhos de pode até ser o mesmo, mas o caminho quando o cientista escolhe um tema de pesquisa que realmente gosta e no qual acredita é muito mais divertido…

Quanto às dificuldades da carreira científica, Noemia não tem muito registro. Ela teve muito apoio da família, que mesmo sem conhecer os passos, desafios e conquistas da carreira científica, lhe deu a estrutura necessária para vencer as adversidades. Inclusive, no dia da cerimônia de diplomação dos novos Membros da ABC da Região Norte, em 22 de abril, ela estava no Japão realizando o pós-doutorado. Como sua mãe havia falecido recentemente, Noemia pediu que o pai fosse receber o diploma em seu lugar. “Várias pessoas que participaram do evento em Manaus me contaram que ele emocionou a platéia, pela alegria e emoção que demonstrou. Fiquei muito feliz em saber disso, e agradeço a ABC por ter proporcionado este momento a ele e a mim. Muito obrigada.”