A Rede Interamericana de Academias de Ciências (IANAS, na sigla em inglês), o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e a Academia Brasileira de Ciências (ABC) promoveram uma reunião em Brasília, com representantes de 15 países americanos, para discutir estratégias de capacitação regional em ciência e tecnologia.


O ministro de C&T do Equador Manuel Baldeon; a vice-presidente do CNPq Wrana Panizzi
e o vice-presidente da ABC e co-presidente da IANAS Hernan Chaimovich

Como co-presidente de IANAS e vice-presidente da ABC, o professor titular do Instituto de Bioquímica da Universidade de São Paulo (USP) Hernan Chaimovich presidiu a reunião. “É muito importante para a IANAS e essencial para a parte sul do continente juntar forças para discutir a construção conjunta de sistemas nacionais de C&T”.

Chaimovich destacou que o papel da ABC é fundamental nessa discussão, assim como o do CNPq, para mostrar aos participantes do encontro como funciona o sistema brasileiro. “Temos o prazer de compartilhar com todos os amigos e vizinhos nossa experiência”, ressaltou o co-presidente, agradecendo aos presentes. “Essa participação maciça demonstra o interesse de todos em construirmos juntos, através do desenvolvimento da ciência e tecnologia, nossa independência no mundo.”

A vice-presidente do CNPq Wrana Panizzi cumprimentou os representantes dos países vizinhos e da América do Norte. Cumprimentou especialmente a presidente da Academia da Guatemala, uma das poucas mulheres presentes.

Wrana esclareceu que o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) foi uma ferramenta essencial na construção do sistema brasileiro de C&T e que mantém, desde os seus primórdios, uma parceria expressiva e intensa com a ABC. “Espero que nossas experiências possam extrapolar fronteiras para confirmar nossos acertos e aperfeiçoar nossos equívocos”.

Ela destacou que o Brasil está num momento especialmente positivo em C&T, com um sistema sólido e visão de longo prazo, num plano que associa o Ministério de Ciência e Tecnologia (MCT) com os outros ministérios, visando estabelecer uma política orgânica. “Estamos construindo uma política de Estado em C&T que se sobreponha aos governos.”

O Acadêmico Glaucius Oliva, diretor de Programas Horizontais e Instrumentais do CNPq, entende que o processo de compartilhar experiências faz com que sejam construídos melhores sistemas em todo os países. Referiu-se a 4ª Conferência Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação (4a CNCTI), realizada recentemente com mais de quatro mil participantes, como um reflexo da força e do crescimento da comunidade científica brasileira.

Instrumentos fundamentais do sistema brasileiro de CT&I

Oliva mostrou que o sistema de C,T&I do país é composto por um conjunto de universidades e institutos de pesquisa. “As empresas estão começando, timidamente, a investir em inovação e o governo está providenciando os recursos, a criação de políticas estimulantes e apoio no que diz respeito à gestão da inovação”. Os recursos para esse fim vêm de diferentes fontes. “Entre 2000 e 2006 os valores quadruplicaram e até o final de 2010 terão aumentado seis vezes”. Ele destacou ainda que o número de publicações aumentou 16 vezes, “quatro vezes mais do que o crescimento médio mundial.”

Mostrando a estrutura do nosso sistema, Oliva referiu-se ao Pronex, programa de apoio a Centros de Excelência com pesquisadores de destaque, assim como aos 123 Institutos Nacionais de Ciência e Tecnologia (INCTs), redes de pesquisadores de ponta de todo o país em áreas específicas e bastante diversificadas. Remeteu-se também ao apoio fundamental da agência Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), no financiamento a projetos tecnológicos; da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes/MEC), na formação de recursos humanos e das Fundações de Amparo à Pesquisa dos estados (FAPs), na estruturação de programas regionais em parceria com o Governo Federal.

Outro elemento essencial no sistema de C&T brasileiro destacado por Oliva foram os Fundos Setoriais. Ele explicou que esses recursos são oriundos dos lucros de empresas de cada setor produtivo e são dedicados exclusivamente ao financiamento de CT&I no país.

O ministro de C&T do Equador, Manuel Baldeon, pediu mais detalhes sobre a origem e a distribuição dos recursos dos Fundos Setoriais. Oliva explicou então o funcionamento desse mecanismo. Esclareceu que os Fundos Setoriais de Ciência e Tecnologia, criados a partir de 1999, têm se constituído no principal instrumento do Governo Federal para alavancar o sistema de C,T&I do país. Os recursos são oriundos de diferentes setores produtivos, derivados de receitas variadas, como royalties, compensação financeira, licenças, autorizações, etc. Não podem ser transferidos entre os Fundos e devem ser aplicados para estimular a cadeia do conhecimento e o processo inovativo do setor no qual se originam. Podem ser apoiados projetos que estimulem toda a cadeia de conhecimento, desde a ciência básica até as áreas mais diretamente vinculadas a cada setor.

Os recursos dos Fundos Setoriais, em geral, são aplicados em projetos selecionados por meio de chamadas públicas, cujos editais são publicados nos portais da FINEP e do CNPq. Para Oliva, “a criação dos Fundos Setoriais representou o estabelecimento de um novo padrão de financiamento para o setor, sendo um mecanismo inovador de estímulo ao fortalecimento do sistema de C&T nacional. Seu objetivo é garantir a estabilidade de recursos para a área e criar um novo modelo de gestão, com a participação de vários segmentos sociais, além de promover maior sinergia entre as universidades, centros de pesquisa e o setor produtivo.”

A Plataforma Lattes, outro instrumento importante no sistema de C&T brasileiro, é um sistema de informação com mais de 1,6 milhões de currículos, com versão em inglês. “Os recursos para grupos de pesquisa só são liberados mediante a atualização dos dados de seus membros na Plataforma. São 22 mil grupos de pesquisa cadastrados”, observou Oliva. O diretório de grupos de pesquisa mostra o número de doutores no país, sua distribuição geográfica e sua distribuição por área do conhecimento. Indica também o número de artigos publicados e os pedidos de patentes registradas de cada indivíduo e de cada grupo.

Histórico da consolidação do sistema de CT&I no Brasil

Hernan Chaimovich resumiu os fatos ocorridos no Brasil numa linha do tempo, iniciada com a criação da ABC em 1916 – uma academia jovem comparada com as da Europa, onde a primeira a ser criada foi a Accademia dei Lincei, em Roma, no ano de 1603. A primeira universidade brasileira foi criada no Rio de Janeiro em 1920, ainda como um agrupamento de faculdades isoladas. A Universidade de São Paulo foi criada em 1934, a primeira nos moldes conceituais, e tornou-se a locomotiva do estado.

O ano de 1948 foi marcado pela criação da SBPC, com o objetivo de reunir os professores de ensino médio e estudantes de graduação para discutir ciência. Em 1951 ocorreu a criação do CNPq e da Capes em . A primeira Fundação de Amparo à Pesquisa foi a de São Paulo, a Fapesp, criada em 1962 e marcada pelo conceito de não politização. A Finep foi fundada em 1967 e em1985, enfim, criou-se o Ministério de Ciência e Tecnologia (MCT).

No ano de 1999 foram criados os Fundos Setoriais, uma ferramenta inteligente de financiamento permanente de C&T. Em 2007 foi realizada a 1ª Conferência Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação (1ª CNCTI) e com ela surgiu o primeiro plano nacional de CT&I que estabeleceu metas estratégicas avaliáveis, realísticas e mensuráveis, cuja evolução pode ser acompanhada e os resultados avaliados.

Em 2003 a ABC publicou um documento encaminhado a todos os candidatos a presidência que, segundo Hernan, foi o motor para o plano de CT&I elaborado em 2007 pelas instituições que pensam e planejam políticas públicas. A Academia publicou ainda um documento sobre educação superior e outro sobre educação básica, fundamentais para a estruturação de um plano de longo prazo para a educação no país. “O documento deixou claro que educação superior não implica em um modelo tradicional de universidade e aponta a fundamental interação academia-empresa”.

O plano de 2007, de acordo com Hernan, resultou muito inovador e completo, deixando claras as metas e os prazos. “Foi a primeira vez no país em que um ministro de C&T indicou as fontes dos recursos financeiros humanos para atingir um determinado objetivo num determinado ano, apresentando um plano para articular a política industrial do país. O MCT não estava apenas olhando para os cientistas, mas para o país como um todo e articulando CT&I com uma política industrial”. Chaimovich observou que se pode constatar que as metas foram estabelecidas adequadamente, ao vermos hoje que todas foram atingidas e algumas vezes ultrapassadas. “A aplicação do PIB em C&T para 2010 alcançou 1,2%, como foi proposto. Não foi alcançado, no entanto, o investimento previsto das empresas em P&D, ponto frágil que precisa ser trabalhado”, destacou Chaimovich.

A proposta para 2010 era alcançar 20% do lucro das empresas. O número foi mantido em 43% do produto nacional bruto, que cresceu muito nos últimos anos, o que evidentemente se reflete no montante, mas o percentual continuou o mesmo, segundo Hernan. “Dos 1,43% do PIB aplicado em CT&I, quase 60% vêm de recursos públicos e pouco mais de 40% da iniciativa privada. Precisamos inverter esses valores”. Nos próximos anos, a Lei de Inovação e Lei do Bem deverão mudar o cenário da inovação no Brasil, a seu ver. Vários programas de governo aumentaram o apoio. Com isso, a subvenção econômica às atividades de pesquisa, desenvolvimento e inovaço nas empresas foi implementada. “Há que se mobilizar o setor privado para ser mais dinâmico na promoção do desenvolvimento tecnológico”, reforçou Chaimovich.

A prioridade máxima, que era expandir e consolidar o sistema de CT&I, foi atingida. As prioridades seguintes – promoção da inovação em empresas e em áreas estratégicas, C&T para o desenvolvimento social – estão tendo seus objetivos revistos para que se deixe uma proposta viável e consistente para o próximo governo. “Construímos um sistema de CT&I forte e consolidado. O desafio é o ponto onde falhamos, de fortalecer a P&D nas empresas para que o país tenha condições legais e econômicas de valorizar o conhecimento construído. Não há como voltar atrás nos ganhos dos últimos anos”, concluiu o vice-presidente da ABC.