Ano de múltiplos eventos, como a realização da Semana de Arte Moderna e a formação da União Soviética, 1922 também marcou profundamente a ciência brasileira e mundial com o nascimento de Oscar Sala, no dia 26 de março, em Milão, onde seu pai brasileiro estava vivendo.
Talentoso físico nuclear, pesquisador e professor, Sala se notabilizou pela natural liderança no desenvolvimento das instituições científicas no Brasil e pelo papel relevante no surgimento da internet no país.
É com orgulho que a Academia brasileira de Ciências (ABC) reafirma a presença de Oscar Sala entre seus membros mais notórios. Sala ingressou nesta instituição no dia 24 de novembro de 1953, foi membro de sua Diretoria entre 1981 e 1993, assumindo a presidência no último triênio, razão pela qual lhe rendemos especial homenagem. Homenagem, por certo, muito aquém da importância do homem e do físico Oscar Sala, mas que pretende fazer valer sua intenção e deixar claro seu pesar.
Sala mudou-se cedo para o Brasil, quando tinha apenas dois anos, em virtude do turbulento período entre guerras na Europa, e não teve dificuldades em obter a nacionalidade. Após sua educação básica em Bauru, ingressou no Conservatório da cidade, onde estudou piano. Em 1941, tornou-se estudante em engenharia na Escola Politécnica. Transferiu-se rapidamente, contudo, para a Faculdade de Filosofia, que incluía o estudo da Física e que colaborou para sua criatividade no domínio.
Formou-se na primeira turma de Física do Brasil em 1945 e associou-se a grandes físicos, como Gleb Wataghin e Giuseppe Occhialini. Com o primeiro, publicou importante artigo sobre penetração de partículas nucleares. Também participou da fundação do Departamento de Física da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São Paulo. Pertenceu a uma geração de ouro da Física brasileira, iniciando suas pesquisas ao lado de Marcelo Damy de Souza Santos, César Lattes, entre outros. Mesmo depois de formado, Sala manteve sua presença na instituição, que evoluiu para o Instituto de Física da USP, como professor e cientista, tornando-se chefe do Departamento de Física Nuclear nos períodos de 1970 a 1979 e de 1983 a 1987.
O talento do italobrasileiro chamou a atenção internacional e a Fundação Rockefeller ofereceu-lhe uma bolsa de estudos em 1946. Nos Estados Unidos, estudou nas universidades de Illinois e de Wisconsin. A aposta dos Rockefeller rendeu frutos: Sala participou na projeção do acelerador eletrostático, primeiro aparelho a usar pulsos de raios na análise de reações nucleares com nêutrons rápidos. Ainda nos Estados Unidos, não deixou de pensar na cidade que escolheu para viver. De fora, projetou o acelerador eletrostático tipo Van de Graaff, a ser desenvolvido em São Paulo. Mais tarde, em 1972, já na USP, ajudaria na construção do primeiro pelletron (acelerador eletrostático de partículas) da América Latina.
Ao retornar ao Brasil, começou sua ininterrupta participação no desenvolvimento das instituições científicas do país e dedicou-se intensamente à construção e organização de laboratórios, tendo em vista a formação de pesquisadores. Ajudou a fundar a Sociedade Brasileira de Física em 1966, da qual foi o primeiro presidente. Igual cargo ocupou na Sociedade Brasileira pelo Progresso da Ciência entre 1973 e 1979.
Foi diretor cientifico da Fundação de Amparo à Pesquisa no Estado de São Paulo (Fapesp) de 1969 a 1974 e presidiu o Conselho Superior de 1989 a 1993. Sua presença corroborou para que a Fundação fosse o único e principal link internacional responsável pelo tráfego acadêmico e assumisse a responsabilidade de registrar domínios “br”. Orientou muitas teses de mestrado e doutorado, enquanto membro da cátedra de Física Nuclear da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da USP.
Na Associação Interciência das Américas, desempenhou mesmo papel que teve na Sociedade Brasileira de Física, fundando-a em 1974 e sendo seu primeiro presidente entre 1975 e 1979. Ocupou a presidência da Academia de Ciências do Estado de São Paulo entre 1985 e 1993. Na Academia Brasileira de Ciências, não é demais repetir, foi vice-presidente de 1981 a 1991 e presidente de 1991 a 1993. Recebeu a Grã Cruz de Ordem Nacional do Mérito Científico em 1994, a medalha de Honra ao Mérito da SPBC em 1973, o Prêmio Moinho Santista em 1981, entre outras muitas homenagens.
A atividade intensa de Oscar Sala foi interrompida por um acidente vascular cerebral (AVC) que dificultou sua locomoção e fala e que poderia tê-lo matado, não fosse a ajuda da família e sua persistência em manter-se vivo. Oscar Sala foi um forte. Apesar de seu estado de vulnerabilidade, sempre fez questão de estar presente nas homenagens que lhe fizeram e visitava com freqüência a Fapesp, com a qual dividiu sua história.
Aos 88 anos, Oscar Sala faleceu no último sábado, dia 2 de janeiro de 2010, por volta das 13h. Segundo familiares, ele teria sofrido uma parada cardíaca enquanto dormia. Além de sua família, a mulher Rosa Augusta Pompiglio, os filhos Luiz Roberto, Regina Maria e Thereza Cristina e os seis netos, Sala deixou um grande legado para a Ciência.
Não podemos saber o que estava sonhando em seu último sono, mas que venham a se realizar os ideais que deixou claros em vida. Muito além do embate político, do qual sempre buscou afastar-se, que prevaleçam o interesse humanitário e que se difunda e se aprofunde o conhecimento científico. A maior homenagem que podemos render-lhe é seguir lutando por esse sonho.
A Academia Brasileira de Ciências lamenta a grande perda e cumprimenta a família.