Baseado em pesquisas que demonstram que os investimentos na educaçãodirecionados à faixa etária entre zero e cinco anos têm um impactofundamental no desempenho futuro do aluno, a Academia Brasileira deCiências (ABC) está realizando estudos a respeito do aprendizado naprimeira infância, após a elaboração de estudos semelhantes sobre aeducação nos níveis superior e básico.

O estudo sobre Aprendizagem Infantil enfoca três principais aspectos: o pedagógico, o econômico e o neurológico. O objetivo é fornecer subsídios para políticas públicas que, levando em conta o conhecimento científico disponível nessas três áreas, maximize os investimentos governamentais direcionados à educação de crianças em período pré-escolar.

O grupo de estudos é composto por Aloísio Pessoa de Araújo, Edson Amaro Junior, Erasmo Barbante Casella, Flavio Cunha, Jaderson Dacosta, João Batista Oliveira, Luiz Davidovich, Ricardo Paes de Barros e Simon Schwartzman. Após várias reuniões no decorrer de 2008, está sendo organizando um seminário internacional em 2009 que contará com a presença dos principais expoentes da pesquisa científica nas três áreas concernidas.

O coordenador do grupo é o Acadêmico Aloísio Pessoa de Araújo, professor titular da Fundação Getúlio Vargas (FGV-RJ) e pesquisador titular da Associação Instituto Nacional de Matemática Pura e Aplicada (IMPA). Graduado em Ciências Estatísticas e em Ciências Econômicas, com mestrado em Matemática e doutorado em Estatística, Aloísio Araújo ocupa-se de Educação Infantil desde o tempo em que o ministro Paulo Renato estava à frente da Educação, no governo Fernando Henrique, entre 1995 e 2002.

A partir de contatos com membros da National Academy of Sciences (EUA), tanto neurocientistas quanto economistas, Araújo envolveu-se em pesquisa que concluiu que o investimento na criança em idade pré-escolar é mais rentável do que o investimento na criança já mais velha.

O diferencial de educação que existe aos quatro anos de idade, segundo Araújo, vai persistir por toda a vida. Se a criança aprende cedo vai conseguir aprender melhor depois, e vice-versa. “Tanto do ponto de vista de uma sociedade mais justa e de uma sociedade mais educada, a atuação precoce no subsídio das famílias mais pobres para garantir a entrada da criança na pré-escola é fundamental num país como o Brasil, vamos ter um impacto muito positivo em longo prazo”, afirmou o especialista.

Formação de capital humano

Com graduação e mestrado em Economia, PhD em Economia pela Universidade de Chicago,  Flavio Cunha atualmente é professor assistente no Departamento de Economia na Universidade da Pensilvânia. Sua área de pesquisa atualmente é em formação de capital humano, realizada conjuntamente com o Prof. James Heckman, da Universidade de Chicago.

O capital humano, segundo Cunha, é multidimensional, envolvendo habilidades cognitivas – como a inteligência fluida e a cristalizada – e habilidades não-cognitivas, como persistência, motivação, aversão à risco, auto-estima, autocontrole, vontade de trabalhar, capacidade de imaginar o futuro e relacionar as atitudes de hoje com as conseqüências amanhã. Em sua pesquisa, Araújo identificou que o mercado de trabalho valoriza ambos os tipos de habilidades.

Ele destacou que essas observações originaram-se de pesquisas realizadas no EUA, que acompanharam grupos de pessoas de diversas origens sociais durante grande parte de sua vida, analisando os itens referidos e medindo, inclusive, a mudança da renda familiar após a escolarização e entrada no mercado da geração mais jovem. “Esta medição permite avaliar a produtividade do adulto que teve a devida estimulação na infância e também os casos opostos, é o que chamamos de capital humano”, destacou o pesquisador.

Cunha explicou que o desenvolvimento das habilidades cognitivas acontece principalmente na infância, quando a capacidade de desenvolvê-las está plena. O fato mais prejudicial para a criança é que sua mãe esteja em depressão. “A mãe deprimida interage pouco com a criança e na primeira infância essa interação é o melhor estímulo que a criança pode receber, especialmente hoje, quando grande parte das famílias é monoparental”, explica Araújo.

Com adolescentes, Cunha defende que rende mais trabalhar com as habilidades não cognitivas – alertar sobre as conseqüências de envolver-se com atividades marginais, ensinar como se comportar no ambiente de trabalho. “A educação para evitar envolvimento com a criminalidade, porém, deve começar muito antes”, alerta o especialista.

O investimento em formação de capital humano, portanto, envolve o tratamento das mães e o estímulo precoce das habilidades cognitivas de crianças em grupos de risco, onde prepondera a pobreza e famílias monoparentais. “O investimento de verbas públicas deve se concentrar na primeira infância das crianças mais pobres e em suas mães, pois é onde vai haver mais retorno. Mas é preciso ter em mente que é um investimento necessário, mas não suficiente, esta criança tem que ser apoiada por muito mais tempo”, concluiu Araújo.

Consciência fonológica

Graduado em Medicina com mestrado em Fisiologia e em Neurociências e doutorado em Fisiologia, Jaderson Costa Dacosta atualmente é professor adjunto na Universidade de Miami e professor da PUC do Rio Grande do Sul.

Dacosta observou de início que nem sempre foi natural associar o cérebro ao aprendizado e à cognição, pois não havia até recentemente dados suficientes para estabelecer essa relação. “O domínio maior foi na área de Ciências Humanas, tentando interpretar como o cérebro funciona”, explicou. Seu trabalho no grupo de estudos da ABC é voltado para o aspecto translacional, transcrevendo dados da pesquisa experimental para o mundo real, ou seja, a clínica.

Segundo Dacosta, a aquisição da capacidade de leitura e da linguagem é complexa na criança, dependendo do reconhecimento de símbolos, que é um processo evolutivo abstrato, altamente elevado. A unidade da escrita, o grafema – que corresponde à sonora, o fonema – é fundamental para o processo de desenvolvimento da leitura.

“A capacidade de percepção dessa unidade, chamada de consciência fonológica, vai ficando mais estável a partir dos cinco anos de idade. Esse tipo de percepção está associado à ativação de circuitos neurais e de regiões específicas do cérebro, com predominância do hemisfério esquerdo. Dentro desse processo há necessidade da integridade de todo o sistema sensorial, que envolve a audição, a visão, a percepção, a atenção e a memória”, explicou o pesquisador.

Observando o cérebro in vivo

A apresentação seguinte foi do Prof. Edson Amaro, que concluiu o doutorado em Medicina pela Universidade de São Paulo em 2000, sendo livre docente desde 2007. Atualmente é professor do Departamento de Radiologia da Universidade de São Paulo, honorary lecturer do Kings College University Of London, médico radiologista do Setor de Ressonância Magnética do InRad do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP e médico neuro-radiologista do Departamento de Imagem do Hospital Albert Einstein.

O especialista em neuroimagem explicou que grande parte do conhecimento que se tem hoje a respeito do cérebro in vivo vem dessa técnica, que gera imagens da estrutura do cérebro, imagens em nível molecular e imagens da função cerebral. “Antes desses novos métodos o cérebro não podia ser examinado, porque a observação só seria útil se a pessoa estivesse viva”, disse Amaro.

No caso do desenvolvimento infantil, segundo o pesquisador, se pode observar o que acontece com o tecido cerebral em função do tempo. “O cérebro vai perdendo volume em geral. Algumas áreas, porém, ficam aumentadas. Podemos mostrar que o desenvolvimento funcional tem uma base estrutural, podemos observar quais as áreas cerebrais que apresentam maior volume à medida que a criança vai adquirindo capacidades como linguagem, memória etc.”, destacou Amaro.

A neuroimagem permite também que, em nível molecular, seja possível acompanhar modificações metabólicas, o que possibilita avaliar os neurotransmissores, que são os componentes químicos do cérebro. “Em breve poderemos avaliar a expressão gênica – que área do cérebro está expressando que genes. Poderá ser feita uma correlação sobre as ligações das moléculas do cérebro que estão associadas a um determinado comportamento – por exemplo, a capacidade de aprendizagem numa criança”.

Amaro explicou que as imagens funcionais estão ligadas às imagens estruturais, mas há técnicas pelas quais se percebem campos magnéticos no cérebro que representam a atividade cerebral. Muitas vezes é uma medida indireta da atividade neuronal. “Estas técnicas podem mostrar patologias, o que é que está alterado, o desenvolvimento da estrutura cerebral e da função cerebral”. O pesquisador ressaltou que, para desenvolver esse tipo de atividade, é necessária uma equipe multidisciplinar envolvendo médicos, psicólogos, físicos, matemáticos e engenheiros de computação.

Ativação, desativação e neuroplasticidade

O médico Jaderson Costa Dacosta retomou a palavra, esclarecendo que o grupo baseou-se em trabalhos que abordavam a questão da leitura e do aprendizado na magnetoencefalografia, na ressonância funcional magnética ou na PET (sigla em inglês para tomografia por emissão de pósitrons) e que foram realizados nos últimos dez a quinze anos. “Estamos falando de um mecanismo de ativação – através de alteração metabólica, alteração de fluxo ou alteração de campo magnético -, é uma correlação com a função”. Dacosta observou que, segundo os estudos mais recentes, os mecanismos de desativação também são importantes para a expressão de uma determinada função.

Referindo-se ao desenvolvimento do sistema nervoso no feto, Dacosta destacou que o período pré-natal é fundamental na formação dessa máquina prestes a começar a exercer várias funções – o cérebro. “Segue uma fase pós-natal, quando devemos nos preocupar com os cuidados com a mãe e com o recém-nascido”, ressaltou o pesquisador.

Os processos de ativação cerebral acontecem mais cedo em algumas áreas do cérebro. “A formação de sinapses, por exemplo, embora ocorra em todo o cérebro, é maior nas áreas posteriores, o que privilegia a percepção sensorial, a visão”. Dacosta explicou que nas áreas anteriores as sinapses se formam mais tardiamente e é a área que envolve julgamento, interpretação e decisão, o que só ocorre entre os quatro ou cinco anos.

“Com relação à aprendizagem, dependendo da idade existem ou não essas ferramentas, necessárias para se executar determinadas funções”, esclareceu o especialista. “Se nós temos que atuar, é preferível que o façamos precocemente, quanto mais tarde mais difícil será o processo”, disse Dacosta. “Nos primeiros anos de vida há uma ativação occipital e temporal bilateral. Com o desenvolvimento, a ativação é mais localizada e se dá mais à esquerda, já há uma dominância hemisférica para essa função”.

Com relação à escolha de métodos de alfabetização, na fase pré-alfabética a ativação do cérebro ocorre com estímulos auditivos e visuais; na fase alfabética se dá uma desativação de uma determinada área, sendo fortalecida a compreensão através de estímulos auditivos. “Mas não é uma mudança radical, a aprendizagem continua, de forma bilateral”, disse Dacosta, observando que a cooperação entre os dois hemisférios é significativa, o que indica que os aspectos artísticos e emotivos também contribuem para o aprendizado.

Dacosta chamou atenção para o aspecto da neuroplasticidade, termo geralmente relacionado a um processo de recuperação de uma lesão. “Mas nós podemos compreender plasticidade como aprendizagem. Sempre que mudamos uma atividade sináptica e começamos a ter um outro comportamento estamos vivenciando um fenômeno plástico. A plasticidade mais freqüente e ativa no dia a dia é a aprendizagem”, ressaltou.

O médico citou uma pesquisa da década de 90 que mostrava uma correlação entre a árvore dendrítica – a rede de contatos sinápticos – com o tempo de educação formal. “Estamos falando de uma modificação da estrutura do cérebro em função do aprendizado, as modificações no comportamento têm uma relação muito íntima com essa arborização. Com as novas técnicas de neuroimagem, podemos ver que isso pode acontecer em horas, muito rapidamente”.

Dacosta encerrou sua intervenção valorizando o avanço tecnológico que possibilitou uma atualização do conhecimento sobre a aprendizagem, permitindo a visualização do processo e provocando considerações no desenvolvimento da criança tanto sobre a ativação como também sobre a inibição de determinadas áreas do cérebro. “A inibição pode ser tão ou mais importante que a ativação, mas só o tempo vai nos mostrar.”

Entendendo a dislexia com bases neurológicas

O palestrante seguinte, Erasmo Barbante Casella, é doutorado em Neurologia pela Universidade de São Paulo, sendo atualmente médico do Instituto da Criança do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HCFM/USP), onde atua como coordenador do ambulatório de Distúrbios do Aprendizado do Instituto da Criança.

Casella explicou que a dislexia está sendo usada como modelo da aprendizagem da leitura porque desde o início se identificou essa disfunção com lesões cerebrais. “É um distúrbio que atrapalha muito a vida de uma pessoa, sem diagnóstico ela cresce tachada de burra, e preguiçosa, e esse rótulo negativo provoca uma baixa auto-estima e falta de motivação para qualquer coisa.”

Através de estudos de imagem cerebral durante o processo de decodificação fonológica – o ato de quebrar palavras em unidades, deletar letras, soletrar palavras que não existem, tirar uma letra e identificar a palavra que se forma, fazer rimas -, fundamental no desenvolvimento da leitura, Casella relatou pesquisas que observaram que as partes do cérebro que costumam ser ativadas em pessoas normais no disléxico não o são.

Com alguns meses de estimulação fonológica, de acordo com o pesquisador, a dislexia melhora, e os exames de imagem cerebral mostram um aumento da ativação no hemisfério direito. “A criança de 4 a 5 anos deve ser exposta à estimulação fonológica adequada para facilitar a leitura mais à frente. Se a estimulação for tardia vai atrapalhar a alfabetização. Se a criança tem uma deficiência auditiva causada por meningite, por exemplo, terá dificuldade de recuperação se o implante for colocado depois dos 6, 7 anos”, reforçou Casella.

Alfabetização: o sucesso do método fônico

O palestrante seguinte foi João Batista Oliveira, doutor em Educação pela Florida State University. Consultor de ONGs e governos, idealizou o programa de aceleração e correção de fluxo escolar Acelera Brasil, do Instituto Ayrton Senna. É autor de 25 livros sobre educação, entre eles A pedagogia do sucesso e Ensinar e aprender.

Juntamente com Luiz Carlos Faria da Silva, Doutor em Educação pela Unicamp, professor adjunto do Departamento de Fundamentos da Educação da Universidade Estadual de Maringá, João Batista publicou um artigo sobre o estado da arte dos métodos de alfabetização. Sua apresentação no simpósio girou em torno do tema.

A mais atualizada ciência da leitura está fundada em evidências de que o ato de ler envolve uma complexa atividade cerebral. A classificação dos métodos de alfabetização, desde então, passou a ter como critério fundamental a abordagem e o uso didático dos elementos da escrita: texto integral, parágrafo, frase, palavras, sílabas, letras e fonemas.

Para aprender a operar com uma escrita baseada em alfabeto, João Batista explicou que o aluno precisa tornar-se consciente de que um princípio a rege: as letras representam sons da fala. “Trata-se do princípio alfabético. Além da compreensão desse princípio, é indispensável o aprendizado das regras de operação do código, ou seja, das correspondências usuais e permitidas entre fonemas e grafemas”, completou o cientista.

Os métodos fônicos ou alfabéticos são os que ensinam, de maneira explícita, as relações entre as menores unidades abstratas significativas e diferenciais da fala (fonemas) e certos componentes da escrita (grafemas, isto é, letras e grupos de letras). Os demais incluem, por um lado, os métodos alfabético-silábicos e, por outro, os métodos constituídos sob a abordagem ideovisual – alguns entre eles considerados mais como uma filosofia da aprendizagem da leitura do que propriamente um método, segundo João Batista.

Após diversas pesquisas realizadas no século XX, concluiu-se que os métodos fônicos, especialmente os sintéticos, são mais eficazes que os outros. Funcionam melhor com crianças mais novas, em torno dos cinco anos, o que sugere a existência de uma janela de oportunidade para iniciar o processo de alfabetização. “Também é útil para crianças com dificuldades em aprender a ler e ajuda a desenvolver competências de compreensão, especialmente em crianças de seis anos, e na aprendizagem da ortografia”, destacou João Batista.

E será que esses achados são válidos para crianças brasileiras, já que foram baseados em estudos realizados em países de língua inglesa? Um estudo publicado no British Journal of Psychology foi decisivo para esclarecer as semelhanças, diferenças e dificuldades na alfabetização crianças em diferentes línguas. O estudo mapeou e descreveu a complexidade silábica e o grau de transparência/opacidade das ortografias de diferentes escritas.

A complexidade silábica refere-se ao grau de predominância das sílabas abertas (CV) – típicas das línguas românicas, como o finlandês, grego, português -, ou de sílabas do tipo CVC e conglomerados complexos de consoantes (denominados fonogramas), como nas línguas germânicas, especialmente no inglês. O grau de transparência/opacidade diz respeito aos padrões de codificação dos fonemas em grafemas.

Entre as 13 línguas cujo aprendizado infantil de leitura foi objeto de análise comparada nesse estudo estava o português de Portugal. “E pode-se ver claramente que nossa língua portuguesa fica a meio caminho entre a transparência e a opacidade do seu código de escrita. O conhecimento da estrutura fonológica de nossa língua permite ver que não é tarefa das mais fáceis ensinar a ler o português brasileiro”, afirmou o pesquisador.

Ao final do período de alfabetização, portanto, as crianças que aprendiam a ler escritas opacas estavam lutando para dominar as estratégias de decodificação. Enquanto isso, as que aprendiam a ler escritas transparentes já haviam dominado completamente essas estratégias. E as que aprendiam a ler escritas como a do português, embora ainda não apresentassem domínio pleno das estratégias de decodificação estavam, quanto a isso, em melhor situação do que as crianças da França e Inglaterra.

Batista chamou atenção para o fato de que o crescimento do dinamismo das ações educativas no campo da pré-alfabetização e de políticas públicas de alfabetização ocorre paralelamente à elevação da demanda de conhecimentos e habilidades na sociedade contemporânea. “Isto se dá tanto em função da emergência da chamada economia do conhecimento quanto do aumento de aspirações de democratização dos sistemas políticos”, afirmou Batista.

Realmente, desde a década de 1990 se intensifica, em todo o mundo, a percepção de que a avaliação de habilidades que integram o desempenho escolar de crianças e adolescentes é condição indispensável para a aferição da efetividade das políticas educacionais. O processo está mais adiantado e enraizado em países cujas sociedades são economicamente afluentes e internacionalmente ganha impulso desde 2000 com o PISA (Programa Internacional de Avaliação de Alunos) e o PIRLS (Progress in International Reading Literacy Study).

Batista observou que estes sistemas vêm produzindo dados abundantes sobre desempenho escolar nas diversas nações e permitindo o posicionamento dos resultados nacionais numa perspectiva de comparação internacional. “Nos países mais desenvolvidos e avançados, quando o monitoramento de dados aponta a inefetividade de uma política, e na proporção em que avançam os conhecimentos sobre a efetividade das políticas, mudanças se realizam”, afirmou o pesquisador. “Nesses países, uma nova geração de políticas educacionais, particularmente no campo da alfabetização, vem sendo implementada, visando a ajustar a ação educativa às evidências científicas.”

Capacitação de profissionais para atendimento familiar

A apresentação seguinte coube ao atual presidente do Instituto de Estudos do Trabalho e Sociedade (IETS) no Rio de Janeiro, o Acadêmico Simon Schwartzman, que estudou Sociologia, Ciência Política e Administração Pública na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), concluiu mestrado em Sociologia pela Faculdade Latino-americana de Ciências Sociais (FLACSO) no Chile e é Ph.D. em Ciência Política pela Universidade da Califórnia.

Schwartzman afirmou que, em função dos recursos gastos em Educação no Brasil, o desempenho educacional das crianças é muito baixo. “Mesmo quando as condições básicas estão garantidas, os alunos não conseguem bons resultados”. Para ele, as deficiências nesse processo são muito graves, havendo um descompasso entre políticas específicas de atenção às crianças antes da escola e da alfabetização e as recomendações que decorrem da evidência.

Em relação à neurobiologia, a evidência é que esta fase pré-escolar é sensível para o desenvolvimento das habilidades envolvidas no aprendizado da linguagem e que o atraso nesse processo tem consequências graves ao longo da vida, tornando-se progressivamente mais difíceis de recuperar. “Quanto mais cedo se intervém, mais rentável é o resultado”, acentuou Schwartzman.

As políticas referentes à primeira infância e à alfabetização devem facilitar e estimular a relação da criança com a mãe, que precisa ser amparada para que esteja presente e em condições de atender a criança. “No Brasil, as ações públicas nesse sentido poderiam contar com o apoio dos profissionais de saúde para atuar nesse atendimento às famílias, como o estímulo à leitura e outras atividades focadas no desenvolvimento da criança nessa fase crítica”, propôs o pesquisador.

A questão da creche tem que ser regulada e acompanhada para que tenha qualidade, com atividades que desenvolvam habilidades e competências que preparem para a alfabetização. “As creches não podem ser apenas depositários de crianças”, disse o Acadêmico.

Em relação à alfabetização, Schwartzman afirmou a importância de se reforçar o processo da decodificação fonológica de forma mais sistemática e mais explícita. “Isso deve se refletir na política de formação de professores, de conteúdos pedagógicos, de livros didáticos e numa política adequada de avaliação de resultados”.

Um dos problemas identificados no Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (PISA) com jovens de 15 anos é que 50% das notas abaixo do esperado ocorrem em função do não entendimento das questões propostas. “É uma dificuldade de compreensão do que é lido, independente da disciplina, então é pior do que não saber matemática ou ciências. O fato é que grande parte dos jovens de 15 anos no Brasil não sabe ler.”

Para lidar com essa situação é fundamental que se façam mais pesquisas nessa área, disse Schwartzman. “Precisamos de dados a longo prazo, estudos longitudinais que venham a permitir que avancemos e acompanhemos as crianças de maneira adequada, poderemos então utilizar isso na capacitação de professores e pessoas envolvidas no atendimento familiar.”